Identifica-se o crescente desenvolvimento do turismo marítimo no Brasil que, visando a atender às demandas, aumenta o número de navios de cruzeiro em circulação e a frequência de viagens
Identifica-se o crescente desenvolvimento do turismo marítimo no Brasil que, visando a atender às demandas, aumenta o número de navios de cruzeiro em circulação e a frequência de viagens. Consequentemente, as ameaças devido à geração de resíduos dos navios se tornam mais agravantes nos aspectos ambientais, como a poluição das águas oceânicas, caso decorra ao mau gerenciamento dos mesmos.
Dessa forma, este estudo possuiu como principal finalidade compreender como é realizada a logística para o gerenciamento de resíduos sólidos em navios de cruzeiro, com foco na análise dos resíduos secos.
De acordo com o IPEA (2012), a situação do gerenciamento dos resíduos sólidos ainda não está totalmente regulamentada, estando em elaboração desde 2011 um Programa de Conformidade do Gerenciamento de Resíduos Sólidos e Efluentes Líquidos nos Portos Marítimos Brasileiros, sob a responsabilidade do órgão IVIG (Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais), cujo principal objetivo é a criação de um sistema de coleta seletiva, a ser implantado em todos os portos brasileiros de maneira eficiente.
Os navios de cruzeiro, devido suas opções de lazer, porte, qualidade e conforto, podem ser considerado, segundo Amaral (2006), um resort flutuante. Abordo desses navios os hóspedes podem desfrutar de diversas atividades, como shows, bares, restaurantes, cinema, dentre muitas outras. Além do aspecto do transporte, pois assim como um avião, por exemplo, os navios transportam os passageiros e geralmente fazem paradas ao longo da viagem, o que proporciona ainda mais lazer aos mesmos, que podem desembarcar e desfrutar mais de perto da cidade em que se encontra. A capacidade de um navio de cruzeiro pode variar entre 2000 e 5000 passageiros.
A grande procura por esse tipo de passeio turístico atualmente tem demandado das indústrias marítimas maiores aperfeiçoamentos de suas embarcações, o que torna os navios de cruzeiros cada vez mais luxuosos e, do ponto de vista ambiental, com uma consequentemente maior produção de resíduos, se tornando uma preocupação ambiental.
Navios de cruzeiro
Estudos apresentados pelo Caderno Virtual de Turismos em 2004 mostraram o crescimento da demanda por lazer nos últimos anos, entre eles o aumento das viagens de cruzeiro, com 223 cruzeiros realizando o transporte de 6 milhões de pessoas no período estudado. A circulação de cruzeiros também gera uma grande movimentação na economia do país, sendo essa uma das razões para esse crescimento (SAAB e RIBEIRO, 2004).
A definição para cruzeiro marítimo, também chamado de navio de passageiro, como citado por Brito (2006), não se refere somente ao navio para transporte, mas à própria viagem, oferecendo uma diversidade de atrações (culturais, históricas e paisagísticas) para o passageiro de forma a entretê-lo durante determinado período de tempo.
Para uma viagem de navio ser considerada um cruzeiro marítimo, a mesma deve ter pelo menos uma pernoite a bordo, caso contrário é considerado apenas um passeio de barco. Atualmente os cruzeiros marítimos são realizados a partir de 4 dias e 3 noites (BRITO, 2006), podendo ter duração total de aproximadamente 15 dias.
Os navios de cruzeiros mais modernos são equipados com uma grande e luxuosa estrutura como piscina, teatro, espaço para shows e esportes, opções de restaurante, entre outros, oferecendo a seus passageiros opções de lazer e conforto durante toda sua estadia.
Gerenciamento dos resíduos nos navios de cruzeiro
Armadoras do Porto de Santos
O terminal CONCAIS, no porto de Santos, São Paulo, recebe diferentes armadoras ao decorrer da temporada de cruzeiros, a qual se inicia no começo de novembro e vai até meados de abril do ano seguinte. Dentre as armadoras que operam no porto, destacamos: MSC, PULMANTUR, COSTA e ROYAL CARIBBEAN (esta última encerrando na temporada de 2015/2016 suas operações no porto de Santos).
De acordo com os dados fornecidos pelo terminal CONCAIS, apresentados na Figura 1, é possível observar que houve um aumento exponencial de navios de cruzeiro que partiram do porto de Santos desde os anos 2000 até 2011, tendo uma queda nos anos posteriores, devido à diminuição da oferta de transatlânticos no Brasil por conta do alto custo de operação, ressaltando que a queda não foi devido à diminuição da demanda por Cruzeiros, já que o interesse por parte dos passageiros por viagens desse tipo vem aumentando em todo o Brasil (ABREMAR, 2014).
Segundo dados do Estudo de Perfil e Impactos Econômicos de Cruzeiros Marítimos no Brasil produzido pela CLIA ABREMAR BRASIL (Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos) em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), foram 10 navios de cruzeiros que fizeram a temporada 2014/2015. O número de cruzeiristas dessa temporada foi de 549.619 e o número médio de pessoas por cruzeiro foi de 54.962. As quatro armadoras que prestaram serviços no Brasil foram a MSC Cruzeiros, Costa Cruzeiros, Royal Caribbean International e Pullmantur, totalizando os 10 navios que juntos ofereceram desde o início até o final da temporada 614.681 leitos.
Processo de gerenciamento de resíduos dentro do navio
Especificamente, tratando-se de resíduos sólidos secos, dentro dos navios de cruzeiros há um espaço no qual se faz a pré-triagem do resíduo. Dessa maneira há a separação dos tipos de resíduos de acordo com suas características físico-químicas em lixeiras específicas. Após identificar a particularidade de cada resíduo, para saber se esse é adequado para reciclagem, os materiais são processados para que haja total compactação, de modo a ocupar menos espaço, facilitando o armazenamento à bordo e seu descarregamento devidamente no porto.
Resíduos como papéis e derivados são propriamente amassados; os metais como latas de refrigerantes são levadas para o devido esmagamento e compactação, aglomerados em fardos; materiais como garrafas de vidro são separados em lixeiras e posteriormente triturados por uma máquina de corte de vidros; resíduos perigosos como pilhas e lâmpadas são armazenados em recipientes anti-contaminação e hermeticamente fechados; alguns materiais processados através da incineração são destruídos em avançados incineradores e filtrados no mar.
Um meio de se constatar o rigor no gerenciamento dos resíduos por parte das embarcações é a posse de certificações ambientais que demonstram seu enquadramento em determinadas ações de sustentabilidade.
As certificações ambientais ainda representam um diferencial competitivo e a legitimidade das ações sustentáveis das instituições, sendo que nesse caso estas seriam referentes às armadoras. Para o mercado, as certificações são investimentos valorizados pelos clientes e acionistas, além de proporcionarem economia financeira, já que visa a eliminação de desperdícios de recursos.
É aconselhável que as empresas busquem pelas certificações que mais se adequem ao seu modelo de negócio. Em geral, as armadoras preferem aderir a NBR ISO 14001:2004, que auxilia na identificação, priorização, prevenção e no gerenciamento dos riscos ambientais, a partir da implantação de um Sistema de Gestão Ambiental.
A armadora MSC Cruzeiros, que já possui certificação ISO 14001, com o objetivo de alcançar melhorias contínuas na área ambiental, desenvolveu sistemas de reciclagem e de tratamento de resíduos de alta tecnologia e de reaproveitamento de água. Também recebeu o prêmio 7 Golden Pearls, que é concedido aos transatlânticos em reconhecimento a diversos segmentos de funcionamento de uma armadora, sendo esta a premiada pelo melhor navio em cuidados ambientais.
A armadora Costa Cruzeiros é uma empresa de origem italiana, que atestou sua preocupação com o meio ambiente pelos padrões estabelecidos nas normas da ISO 14001. Sua frota é certificada pela RINA (Registro Naval Italiano) com o selo Green Star, que certifica que todos os navios da empresa cumprem as normas de prevenção da poluição marítima e atmosférica.
Já a Royal Caribbean International possui em sua frota global 12 navios com reutilização completa de dejetos operacionais não perigosos. E em 2013, a armadora constatou um aumento de 116% no volume de dejetos reciclados a bordo, sendo que a empresa atende aos padrões ambientais internacionais voluntários, por meio do sistema de gerenciamento da ISO 14001.
Essa armadora optou pelo direcionamento de responsabilidades para os agentes ambientais, que atuam em determinado segmento ambiental dento do navio, sendo eles responsáveis pela supervisão do programa ambiental; os treinamentos ambientais para a tripulação; o gerenciamento do descarte de detritos sólidos e líquidos, perigosos ou não; e o gerenciamento dos resíduos químicos e da segurança do ambiente de trabalho.
Nos últimos anos, as principais premiações com temas ambientais da Royal Caribbean International foram pelos navios com impactos ambientais positivos, pelo desenvolvimento de projetos de conversação ambiental, pelas inovações ambientais de seus navios, pelo turismo responsável e pelos negócios sustentáveis.
Além das armadoras, o Terminal Marítimo de Passageiros Giusfredo Santini - CONCAIS, localizado no Porto de Santos, no litoral de São Paulo, também é uma das instituições que busca certificações ambientais. Por isso, após alguns anos de preparação para a auditoria, se tornou o primeiro terminal de passageiros no país certificado pela NBR ISO 14001:2004.
Processo de Transbordo dos Resíduos do Navio para o Porto de Santos
Dentre as empresas que fornecem os serviços de retirada de resíduos sólidos secos/ líquidos de navios cruzeiros no Porto de Santo, foi observado que a RF Maluf é a empresa mais contratada pelas principais armadoras (MSC, ROYAL, PULMANTUR, COSTA).
A seguir, as Figuras abaixo ilustram os principais processos de transbordo que ocorre do navio para o porto.
Nas Figuras 2 e 3, é possível observar funcionários da RF Maluf, utilizando luvas e máscara, e com auxílio de uma talha manual realizando o transbordo do resíduo do navio para o porto. Verifica-se que há uma rede entre o navio e o porto evitando, assim, que alguns resíduos que se desprendam no transbordo atinjam a água; nota-se também que o resíduo já sai compactado do navio.
Já na Figura 4, observam-se caminhões utilizados no processo de transbordo de resíduo do navio para o porto que, logo após o transporte, seguem para a destinação final do resíduo. Verifica-se que há um devido cuidado com queda de resíduos no porto. Na segunda imagem há uma lona embaixo do caminhão e uma rede entre o navio e o porto, evitando assim que, caso haja algum desprendimento de resíduo durante o transbordo, atinja a água.
Após o transbordo do resíduo do navio para os caminhões há um acondicionamento manual, como pode ser observado na Figura 5.
Uma vez realizado o transbordo do navio para os caminhões, é realizado a disposição final deste resíduo. Dentre as técnicas de disposições finais realizadas operadas peal RF Maluf, estão:
• Aterros particulares – Local para disposição de resíduos não perigosos, com sistema de proteção e monitoramento garantindo segurança e confiabilidade.
• Co-processamento – Tratamento térmico onde o resíduo é aproveitado como fonte de energia ou matéria prima no processo de fabricação de cimento.
• Reciclagem – Processo de reaproveitamento de materiais descartados de forma a reduzir a quantidade de resíduo produzido.
• Tratamento de efluentes – Consiste na remoção da contaminação presente em efluentes líquidos.
Considerações finais
A questão ambiental no Brasil tem sido tratada de forma ostensiva nos últimos anos, ações de educação básica, de fiscalização, de incentivo e promoção de benefícios ao meio ambiente, tornaram-se objetos de busca não só pela sociedade civil, mas pelas pessoas jurídicas, que, muitas vezes, veem nessas práticas a possibilidade de colaborarem com a preservação da natureza e agregarem valor ao seu produto.
Nesse sentido, foi possível constatar que tal fato é plenamente observado no segmento de embarcações de cruzeiros. Dado sua dimensão e capacidade de transportar pessoas, existe a necessidade premente da gestão de seus resíduos, sob pena de se tornarem um polo gerador de poluição.
No caso específico das empresas que atuam no Porto de Santos em São Paulo, no geral, atendem as exigências legais, buscando constantes melhorias em suas práticas sustentáveis; demonstrando o valor da Gestão Ambiental e de suas ferramentas na implementação e condução dos processos de coleta, armazenamento e disposição final de seus resíduos sólidos.
Prof. Dr. Fábio Campos
Prof. Dr. da Escola de Artes e Ciências Humanas (EACH) da USP
Andressa de Oliveira Melo Maciel; Carolina Barreto Nascimento; Gustavo Ribeiro de Almeida; Herica Tiepolo Lee; Karina Boratino de Araújo e Larissa Lika Naruse
Graduandos do curso de Gestão Ambiental da Escola de Artes e Ciências Humanas (EACH) da USP
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Referências bibliográficas:
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