Desenvolvimento De Uma Bancada De Testes Para Filtração Em Fase Líquida. Estudos De Caso: Filtro Autolimpante E Filtro Cesto

Nos últimos anos, o desenvolvimento de novas tecnologias aumentou a aplicação da filtração, que se tornou obrigatória em muitos processos importantes de indústrias dos mais diversos setores, como indústria química, alimentícia, farmacêutica etc


Nos últimos anos, o desenvolvimento de novas tecnologias aumentou a aplicação da filtração, que se tornou obrigatória em muitos processos importantes de indústrias dos mais diversos setores, como indústria química, alimentícia, farmacêutica, tratamento de água e esgoto, geração de energia e biotecnologia. Além disso, a maior preocupação com o meio ambiente ajudou a aumentar ainda mais a importância dessa operação (IRITANI, 2007; DICKENSON, 1997). 
O filtro tipo cesto, além de versátil, apresenta simples construção. Ele é composto por uma tela de arame reforçado e/ou chapa perfurada em formato cilíndrico, sendo posicionado dentro de um vaso selado através do qual flui a corrente de alimentação sob pressão. A filtração acontece até que o cesto fique bloqueado com os sólidos retidos, quando o fluxo é interrompido e o cesto é retirado manualmente para troca ou limpeza (TARLETON e WAKEMAN, 2007). Há ainda os filtros autolimpantes, nos quais o cesto não necessita ser trocado, sendo adequado para operações contínuas ou em situações nas quais a exposição dos operadores ao fluido do processo é indesejável. Entre os tipos de filtros autolimpantes, encontram-se os de retrolavagem, que se regeneram através da inversão do fluxo pelo meio filtrante, e os limpados mecanicamente, que usam um raspador para retirar as partículas do cesto (RAU, 2015). 
Uma vez que as aplicações industriais têm se tornado cada vez mais exigentes e cada vez mais áreas de processos estão sujeitas à filtração, há uma demanda crescente por inovação e conhecimento nesta área. Nesse contexto, o presente trabalho visa analisar e comparar os filtros cesto e autolimpante, através do projeto de uma bancada experimental para o estudo da filtração superficial em fase líquida. Assim, são avaliadas as curvas de perda de carga, a permeabilidade dos meios filtrantes e a resistência específica das tortas de filtração, usando-se suspensões de carbonato de cálcio. 

Materiais e métodos
O material particulado utilizado foi calcita de malha 100, cujo diâmetro médio volumétrico foi obtido utilizando o equipamento Malvern Mastersizer Microplus, pertencente ao Laboratório de Controle Ambiental do Departamento de Engenharia Química da UFSCar. A análise da distribuição granulométrica das partículas é apresentada na figura 1, sendo o diâmetro médio volumétrico igual a 39 m.

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Os filtros cesto e autolimpante empregados foram projetados conforme código ASME VIII divisão 1, com fabricação em aço carbono e  pressão de projeto de 10 kgf/cm2. Os elementos filtrantes são de aço inox com estrutura externa de chapa perfurada para resistência mecânica e aberturas nominais de 25 µm, 50 µm e 100 µm. Suas respectivas caracterizações, obtidas através de imagens da superfície por Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV - Departamento de Engenharia de Materiais, UFSCar), são apresentadas na figura 2. Nota-se que são estruturas consideravelmente planas, sendo o meio de 25 µm bastante fechado.

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O fluxo nos elementos é de dentro para fora, com as partículas permanecendo depositadas em seu interior. No caso do filtro autolimpante, por ser do tipo limpado mecanicamente, utiliza-se uma escova rotativa conectada a um motor para a retirada de partículas. A figura 3 mostra a vista lateral dos dois filtros, em que apresenta a carcaça do filtro com o elemento filtrante na parte interna. 

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A bancada de testes utilizada é apresentada na figura 4, sendo constituída por: uma bomba centrífuga; dois reservatórios de 400L, sendo um para armazenamento da suspensão a ser filtrada e outro para o filtrado, além de um termômetro com precisão de 2% F.E., para controle da temperatura da suspensão. Ainda nesta figura é possível verificar a presença de um manômetro digital, com precisão de 0,25% F.E., para medição da perda de carga nos filtros; um rotâmetro, com precisão de 2% F.E., para medição da vazão de filtrado; válvulas esferas de 2" e tubulações de PVC de 2’’. 

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No interior do tanque de armazenamento da suspensão a ser filtrada foi instalado um quebra-vórtex, já que foi notada a formação de vórtex, conforme se colocava a bomba em funcionamento. Isso prejudicava o desempenho da bancada, uma vez que muitas bolhas de ar eram formadas. A figura 5 mostra o vórtex formado e o quebra vórtex instalado no reservatório.

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Métodos
Primeiramente foram realizados ensaios em triplicata, utilizando somente água para avaliar a permeabilidade de cada meio filtrante. Variou-se a velocidade superficial do sistema de 1,7 a 14 cm/s através das válvulas e observou-se a respectiva alteração de perda de carga. Assim, calculou-se a permeabilidade dos meios utilizando-se a equação de Forchheimer:

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Em que ΔP é a queda de pressão (Pa), L é a espessura do meio (m), µ é a viscosidade dinâmica do fluido (Pa.s), vS é a velocidade superficial (m/s), k1 é a permeabilidade darciana (m2), k2 é a permeabilidade não darciana ou inercial (m) e ρ é a densidade do fluido (kg/m3).
Já para os ensaios de filtração adicionou-se o carbonato no tanque com 130L de água nas concentrações de 0,5 g/L e 1,4 g/L, deixando-se misturar por 15 minutos pelo movimento de retorno da água por uma das válvulas. Então, abrindo-se a válvula imediatamente anterior ao filtro, iniciou-se a filtração, anotando-se a perda de carga e a vazão de filtrado de acordo com o tempo. Desse modo, foram obtidas as resistências específicas da torta e do meio pelo uso da equação:

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Em que q é a vazão de filtrado (m3/s), A é a área da seção transversal (m2), Cs é a massa retida no filtro por volume de filtrado (kg/m3), Vf é o volume de filtrado (m3), α é a resistência específica da torta (m/kg) e Rm é a resistência específica do meio filtrante (m-1).

Resultados e discussão
Com os ensaios de filtração com água limpa foram obtidas as curvas de perda de carga para os diferentes elementos filtrantes, sendo apresentadas na figura 6. A análise do gráfico da figura 6 mostra que o elemento de 25 μm do filtro cesto apresenta perda de carga muito mais elevada do que os outros, o que revela uma vantagem do filtro autolimpante em relação ao cesto, com respeito a telas de menores aberturas. O gráfico da figura 7 foi obtido com os mesmos dados de perda de carga da figura 6, porém em função da velocidade superficial, excluindo-se o elemento de 25 μm para melhor visualização dos outros. As áreas dos elementos dos filtros são diferentes, sendo de 0,033 m2 para o cesto e de 0,050 m2 para o autolimpante, implicando em velocidades diferentes para as mesmas vazões.

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A figura 7 mostra que para velocidades mais baixas a perda de carga do cesto e do autolimpante são muito próximas. Já para velocidades superficiais mais elevadas a queda de pressão é mais acentuada no autolimpante. Fazendo-se os ajustes polinomiais nas curvas e utilizando-se a equação (1), com L=5,2.10-5 m, obteve-se uma média para o autolimpante de k1=2,6.10-12 m2 e k2=6,2.10-8m. Já para o cesto calculou-se, em média, k1=1,9.10-12 m2 e k2=6,2.10-7 m. Assim, nota-se que a perda de energia por dissipação viscosa é similar para  os dois tipos de filtros, já a perda de pressão por ação inercial,  causada pela alternância de aceleração e desaceleração do fluido e por sua mudança de trajetória durante a permeação pelos poros, é uma ordem de grandeza maior no autolimpante. 

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O resultado da filtração de CaCO3 com os diferentes elementos dos dois filtros é mostrado na figura 8. Foram realizados ensaios com concentrações de 0,5 g/L (para os elementos de 100 µm) e 1,4 g/L. A concentração de 0,5 g/L foi suficiente para bloquear o cesto após 50s aproximadamente, já no autolimpante essa concentração praticamente não alterou a perda de carga, não havendo limpeza durante o teste. Assim, foram feitos ensaios com concentração maior, de 1,4 g/L, no qual houve um aumento pronunciado da perda de carga. No caso do autolimpante, foi realizado um ciclo de limpeza, com o motor sendo acionado quando ΔP atingiu seu pico e desligado no ponto mais baixo, o que mostra que houve uma limpeza apropriada. Outro fato observado foi a menor eficiência de limpeza para malhas mais fechadas, talvez por oclusão permanente de algumas aberturas, as quais a escova não conseguia alcançar de maneira eficaz, devido ao seu menor tamanho. Nestes casos, o uso de retrolavagem poderia ser mais efetivo. Já no caso do cesto, para essa concentração mais elevada o teste durou poucos segundos, já que a vazão caiu quase instantaneamente, em razão do entupimento do cesto, evidenciado pela elevada perda de carga.
Pelos ajustes lineares para as concentrações de 0,5g/L e através de equação (2), com Cs=0,01 kg/m3, calcularam-se a resistência do meio filtrante e da torta, sendo para o cesto Rm=6,0.106 m-1 e α=7,9.108 m/kg e para o autolimpante, Rm=6,4.106 m-1 e α=4,0.108 m/kg. Desse modo, a resistência dos meios filtrantes foi parecida, porém a resistência específica da torta foi o dobro para o cesto, no caso da concentração de 0,5 g/L.

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Conclusão
A bancada de testes construída atendeu satisfatoriamente ao seu propósito de realização de ensaios de filtração tanto em relação ao filtro cesto quanto ao autolimpante, proporcionando experimentos de maneira simples e prática. O filtro autolimpante também funcionou de maneira apropriada, já que a perda de carga diminuiu consideravelmente quando o motor foi acionado, voltando a subir logo após sua parada. Comparando-se o desempenho dos filtros, pode-se afirmar que o autolimpante apresentou elemento com perda de carga maior para vazões mais altas de água limpa, exceto para o caso do elemento de 25 μm. No entanto, nos ensaios de filtração o cesto ficou bloqueado muito mais facilmente do que o autolimpante, que por sua vez suportou concentrações mais altas de carbonato de cálcio por mais tempo. Assim, o filtro do tipo autolimpante, apesar de possuir um preço mais elevado, justifica seu custo pela capacidade de filtração de partículas em concentrações maiores, além da praticidade em relação à sua limpeza. 


Edison Ricco Jr, Felipe A. da Cunha, Paula S. Hashimoto, Prof. Dr. Luiz F. de Moura e Profa. Dra. Mônica L. Aguiar
Universidade Federal de São Carlos 


Referências bibliográficas:
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