Segmentos, filtragem, novas tecnologias, escolha ideal, manutenção e mercado dos não tecidos
Por Cristiane Rubim
Edição Nº 106 - Setembro/Outubro de 2020 - Ano 19
Os não tecidos hoje são alvo de estudo para o desenvolvimento de novas tecnologias, eles atendem diversas aplicações em diferentes segmentos
Devido aos seus benefícios e ao crescimento do seu uso, os não tecidos hoje são alvo de estudo para o desenvolvimento de novas tecnologias. Eles atendem diversas aplicações em diferentes segmentos e trazem uma série de vantagens para o processo de filtração. Para entender um pouco dos não tecidos, é importante estar a par das dicas e orientações de Daniel Zocchio, vendedor técnico do depto. comercial da Interfiltros, para fazer a escolha adequada do não tecido para a aplicação, sobre situações que podem ocorrer com o não tecido e como fazer a manutenção correta dele. Um panorama dos setores desse mercado antes e após o início da pandemia do coronavírus é apresentado por Carlos Eduardo Benatto, diretor geral da Fibertex, que fornece outras informações importantes sobre não tecidos.
Classificação e processos
O não tecido, também chamado de feltro, tem estrutura plana, flexível e porosa constituída de véu ou manta de fibras ou filamentos, orientados ao acaso, consolidados por processo mecânico (fricção), e/ou químico (adesão) e/ou térmico (coesão) ou combinações deles (norma NBR-13.370).
De acordo com Zocchio, os não tecidos classificam-se pelo: processo de fabricação, variados tipos de matérias-primas, características das fibras/filamentos, processo de consolidação, gramatura, processo de transformação e/ou conversão ou ainda a associação desses elementos.
Existem diversos tipos de não tecidos (feltros) utilizados para o mercado de filtração e processos de fabricação, entre os quais, segundo ele, destacam-se:
Não tecidos produzidos por agulhagem – As fibras ou filamentos são entrelaçados através da penetração alternada de muitas agulhas que têm saliências/barbelas.
Não tecidos fabricados por hidroentrelaçamento, também chamados de spunlaced ou hydroentangled – O entrelaçamento das fibras ou filamentos é feito pela penetração na manta de jatos d’água a altas pressões.
Não tecidos produzidos por Spunbonded – Um polímero termoplástico é fundido através de uma “fieira”, resfriado e estirado, e, posteriormente, depositado sobre uma esteira em forma de véu (manta) que irá compor o não tecido.
Não tecidos fabricados por Meltblown – Um polímero termoplástico é fundido através de uma “fieira” com orifícios muito pequenos e um fluxo de ar quente rapidamente solidifica a massa em fibras muito finas, que são sopradas em alta velocidade para uma tela coletora, formando a manta que irá compor o não tecido.
Segmentos de aplicações
Conforme Benatto, pode-se dividir o mercado em filtração líquida e filtração seca:
• Na filtração líquida, existem os filtros de água, filtros de piscina, filtros de ordenhadeira; centrais de óleo, filtração de diesel (mercado novo), filtros bags; filtro para bolsa de colostomia etc;
• Na filtração seca, dispõem-se dos filtros mangas; HVAC (mercado novo para o HEPA); máscaras e respiradores (EPI), respiradores mecânicos, filtro de cabine automotiva; filtro de ar automotivo (mercado um pouco mais novo), filtros cartuchos, filtros hospitalares etc.
A grande variedade e versatilidade dos não tecidos permite o uso cada vez maior e mais diversificado deste tipo de material como meio filtrante nos mais diversos segmentos da filtração. Entre eles, Zocchio cita:
• Filtros de ar industriais para reter partículas, como filtros manga, cartuchos, plissados, filtros para painéis elétricos, entre outros;
• Filtros de ar para sistemas HVAC e salas limpas: filtros grossos, médios e finos, filtros absolutos etc;
• Produtos de consumo: aspiradores, coifas, piscinas, PCs, entre outros;
• Indústria de alimentos e bebidas: leite, vinho, chá, óleo vegetal etc;
• Indústria farmacêutica e médica: filtração de sangue, filtro bacteriano etc;
• Filtros para fluidos de usinagem: filtração do cavaco para reaproveitamento do óleo;
• Filtros bag: para líquidos em geral;
• Automobilístico: filtro de cabine de ar condicionado, filtro de ar do motor, filtro de óleo e filtro de combustível;
• Máscaras filtrantes: máscaras cirúrgicas, respiradores utilizados como EPI;
• Filtrações especializadas (antimicrobiana, odores), entre outras.
Atuação nas filtragens
Os não tecidos possuem uma estrutura tridimensional e porosa, garantindo alta eficiência de filtragem sem impedir o fluxo, seja um fluxo líquido ou gasoso. “As mídias sintéticas propiciam maior vida útil, boa resistência mecânica e melhor desempenho à umidade. Por exemplo, elas reduzem o risco de proliferações de fungos e bactérias em filtros de ar condicionado automotivo. Além desses benefícios, elas são economicamente viáveis para qualquer tipo de projeto” – explica Benatto, da Fibertex.
Os não tecidos atuam de duas formas no processo de filtração:
• Na filtração de superfície;
• Na filtração em profundidade.
Na filtração superficial, o meio filtrante atua como uma barreira plana, retendo as partículas na superfície do material, com comportamento semelhante ao de uma peneira. “Neste tipo de filtração, o tamanho da partícula filtrada deve ser maior que os ‘poros’ da superfície do meio filtrante para que a partícula possa ser retida. Caso contrário, haverá passagem de partícula pelo meio filtrante. A filtração superficial ocorre tanto nos tecidos como nos não tecidos” – ressalta Zocchio, da Interfiltros.
Já a filtração em profundidade ocorre em meios filtrantes mais espessos e com várias camadas de poros, como a maioria dos não tecidos. “Devido à própria característica de formação do não tecido, o material tem várias camadas de fibras sobrepostas que resultam em uma estrutura tridimensional que forma uma espécie de “labirinto” tortuoso ao longo de sua secção transversal, que eleva as chances de retenção da partícula” – explica.
Sendo assim, o não tecido retém partículas maiores na superfície (filtração superficial) e partículas progressivamente mais finas através de sua espessura (filtração em profundidade). “Apesar da filtração superficial também contribuir para o processo de filtração, uma das grandes vantagens do não tecido é justamente a capacidade de realizar a filtração em profundidade e, consequentemente, uma maior eficiência para o processo de filtração” – destaca Daniel Zocchio da Interfiltros.
Zocchio aponta as vantagens do uso de não tecidos no processo de filtração:
• Remoção de ampla gama de contaminantes da água e do ar: bactérias, vírus, metais, minerais, poeiras, pós tóxicos e/ou agressivos à saúde etc;
• Alta capacidade de retenção (maior eficiência de filtração);
• Maior vida útil do meio filtrante;
• Alto nível de capacidade de fluxo;
• Elevada permeabilidade ao ar (menor perda de carga);
• Resistência química;
• Resistência a rasgos e perfurações;
• Elevada resistência à tração;
• Resistência a abrasão;
• Estrutura moldável e uniforme;
• Aplicação de tratamentos: repelência a líquidos, resinas, retardante a chama etc;
• Absorção de gorduras e óleos, entre outros.
Mercado antes e depois do início da pandemia Carlos Eduardo Benatto, diretor geral da Fibertex, faz uma avaliação geral da situação de cada segmento do mercado de filtragem com não tecidos antes e depois do início da pandemia do coronavírus no Brasil. Filtro de manga – Utilizado em empresas que geram muito particulado: indústria de cimento, química, siderurgia, moveleira; fertilizantes; mineração; usina de asfalto; termelétrica a carvão etc. “O primeiro trimestre foi bom e trouxe otimismo, mas, após a pandemia, este mercado sofreu uma queda, acompanhando a redução da atividade industrial. Novos projetos de filtros caíram de forma ainda mais significativa” – afirma Benatto. HVAC – Usado em indústrias farmacêuticas, laboratórios, hospitais etc. “Este mercado aqueceu após a pandemia devido à alta demanda nos hospitais e indústrias farmacêuticas. Há maior preocupação das empresas, escritórios e shoppings na troca do filtro de ar condicionado. Novos projetos de ar condicionado estão sendo feitos com filtros de maior eficiência e maior troca de ar” – revela. Filtração líquida – Bags: indústria química e alimentícia. “Esse mercado não é muito grande, mas não apresentou queda de volume. A redução na indústria química foi compensada pela alimentícia” – comenta Benatto. Filtração líquida central de usinagem – Segundo o diretor-geral da Fibertex, houve redução no volume. Este mercado é responsável pelos maiores volumes: montadoras; autopeças; siderúrgicas; linha branca e metalúrgicas. Respiradores – Aumentou o volume desde o começo do ano por causa da pandemia na China. “Após a pandemia no Brasil, este mercado explodiu” – diz. Máscaras cirúrgicas – “Após a pandemia no Brasil, muitas empresas de confecção aproveitaram para produzir as máscaras. Algumas empresas grandes investiram em linha de produção. Mercado ainda em alta. Antes, a maioria do material vinha pronto da China” – ressalta Benatto. Filtros de cabine automotivo – Este mercado iniciou o ano com bastante otimismo e aumento de volume, porém, após o Covid-19, houve redução de volume. “Tanto a indústria automotiva – peça original – quanto o mercado de reposição foram duramente impactados. Abril e maio foram bem complicados. Há uma perspectiva de aumentar o volume em filtros de ônibus, que, além de não tecido, usam muita espuma, em função de uma manutenção mais efetiva” – analisa. Filtros automotivos em geral – Redução no volume desse mercado. “Tanto a montadora quanto a reposição, com as lojas fechadas em razão da quarentena, foram bem impactadas” – pondera Benatto. Filtros cartuchos/mangas plissadas – Filtros usados nos mais variados tipos de indústria. “Este mercado iniciou o ano com otimismo e boas vendas. Após a Covid-19, houve redução, acompanhando a diminuição da atividade industrial” – diz. Filtros de água – Apesar do consumo de água não ter caído, muitos filtros são vendidos no varejo. “O varejo foi impactado e, por isso, houve redução na venda de filtros” – salienta Benatto. |
Novas tecnologias
Com suas grandes vantagens e o crescimento do seu uso, os não tecidos para a filtração têm se tornado alvo de estudos, propiciando o desenvolvimento de várias tecnologias, segundo Daniel Zocchio, entre elas:
• Aplicação de tratamentos especiais, como os feltros hidrorrepelentes;
• Aplicação de membranas, como as microporosas expandidas de PTFE;
• Aplicação de adesivos, como EVA e PEBD, caso de alguns feltros destinados à indústria automotiva;
• Impregnação com carvão ativado para a filtração de odores, utilizados em respiradores faciais (máscaras de EPI) e filtros de cabine automotivos;
• Mistura de fibras (fiber blends) de diferentes materiais, permitindo a criação de feltros com características customizadas, como os feltros de propriedade antiestética;
• Utilização de micro e nanofibras que elevam ainda mais a capacidade de retenção e eficiência dos não tecidos com menores perdas de carga e gastos de energia.
“O maior avanço no campo da filtração é o uso da nanotecnologia. A nanofibra aumenta de forma significativa a eficiência do não tecido e sua vida útil, mantendo a perda de carga baixa por mais tempo” – afirma Benatto. Ele diz que existem outras tecnologias mais recentes que combinam mais de um layer de não tecido.
E também as fibras mais finas e com pontos de fusões diferentes para atingir a propriedade necessária de uma aplicação específica.
Situações que ocorrem
“Os não tecidos podem sofrer problemas de saturação precoce, ataques químicos, térmicos e por abrasões” – diz Benatto. Mesmos com esses riscos, segundo ele, os não tecidos têm vida útil e resistência mecânica muito maiores que outros tipos de mídia.
“Como os não tecidos possuem ampla gama de aplicações em processos de filtração, cada uma delas irá apresentar suas próprias características e particularidades. Por esse motivo, os problemas que surgem a partir do uso dos não tecidos também podem variar, dependendo do tipo de filtração e aplicação a que o material for submetido” – explica Zocchio.
Analisando de um ponto de vista macro, segundo Zocchio, observa-se que os principais problemas dos feltros utilizados para filtração estão relacionados a(o):
• Saturação precoce do meio filtrante (baixa vida útil do não tecido) e/ou elevada perda de carga (gasto de energia);
• Baixa eficiência de retenção das partículas filtradas;
• Surgimento de perfurações, furos ou rasgos causados por agentes externos, pressão excessiva sobre o elemento filtrante etc;
• Incompatibilidade do material que está sendo filtrado com o tipo de não tecido utilizado;
• Ataque químico, térmico ou mecânico do meio filtrante devido à utilização de material incompatível com a aplicação.
De acordo com Zocchio, boa parte destes problemas surge principalmente pelo uso do não tecido em condições divergentes da projetada ou informada inicialmente para o processo. Ele cita alguns exemplos de alterações que podem impactar e alterar o comportamento da filtração durante a utilização de um não tecido:
• Mudanças nas características do particulado: distribuição granulométrica, concentração, densidade, abrasividade etc;
• Mudanças no fluido: temperatura, vazão, viscosidade, composição gasosa, entre outras.
Outros exemplos:
• Falhas na manutenção/conservação ou operação inadequada dos equipamentos podem interferir no desempenho do não tecido;
• Problemas no sistema de limpeza ou regeneração do equipamento (quando existente) tendem a aumentar a quantidade de particulado sobre o não tecido filtrante, causando sua saturação precoce;
• Nos sistemas com componentes ou acessórios enferrujados, a ferrugem pode levar ao desgaste ou à perfuração do não tecido.
Acerto na escolha
A escolha de um não tecido inadequado para uma aplicação também trará problemas para o processo de filtração. “O conhecimento do não tecido e de suas propriedades é de extrema importância para que equívocos não sejam cometidos na hora de decidir o melhor meio filtrante para a aplicação” – alerta Zocchio.
Ao especificar ou escolher um não tecido para o processo de filtração, além de conhecê-lo, é preciso assegurar que ele seja compatível com as condições de operação onde será aplicado. “Não faria sentido, por exemplo, escolher um não tecido com tratamento hidrorrepelente para filtração de água contaminada. Assim como também não seria recomendado utilizar um não tecido de gramatura leve – geralmente mais permeável ou mais ‘aberto’ – para filtrar um particulado extremamente fino, pois existiria alta probabilidade de que o particulado não fosse retido por esse não tecido” – enfatiza o vendedor técnico da Interfiltros.
Como fazer a manutenção
A principal recomendação para a manutenção de um bom processo de filtração com não tecidos, segundo Zocchio, é procurar, dentro do possível, manter as condições de projetado ou as condições informadas quando da especificação do não tecido: condições do particulado, condições do fluido, parâmetros de operação etc. “Em caso de alterações, procure sempre detectar quais foram as mudanças verificadas, registre e informe o suporte técnico do fornecedor para que seja avaliado o uso de um não tecido mais adequado para essa nova condição de operação” – orienta.
É preciso realizar a troca do não tecido quando ele apresentar sinais de saturação. “O mais recomendado é fazer medições periódicas, que permitam monitoramento frequente do nível de saturação do não tecido. Um exemplo clássico é a utilização do manômetro, usado em grande parte dos sistemas de filtração de ar, que reflete o nível de resistência à passagem do fluido oferecida pelo não tecido” – diz Daniel Zocchio da Interfiltros.
A partir de medições contínuas, Zocchio explica que é possível saber não apenas o nível de saturação do não tecido, mas também o momento mais adequado para a troca dele, evitando trocas prematuras – com maior número de paradas para trocas – ou tardias, que podem prejudicar o desempenho do processo, reduzir produção, gerar passagem de partículas acima do desejado etc.
Outro ponto importante, segundo ele, é fazer a revisão contínua do sistema de filtração para assegurar que todos os componentes estejam em bom estado e funcionando adequadamente, como mecanismos de limpeza, válvulas, manômetros, gaiolas, pneumáticos, boias, entre outros.
Daniel Zocchio explica que grande parte dos equipamentos/sistemas de filtração envolve componentes e acessórios mecanicamente mais resistentes que os não tecidos, o que leva o não tecido a ser caracterizado como um dos componentes mais frágeis que merece cuidado e atenção. “Por esse motivo, é recomendado que os não tecidos sempre sejam armazenados em local seco, limpo, isento de umidade e não sujeito à ação de intempéries ou animais. Além disso, que sejam manuseados com os devidos cuidados, inclusive durante a instalação, para evitar danos que impactem no seu desempenho” – ensina.
Por ser um dos componentes mais sensíveis, o não tecido é o primeiro a refletir qualquer alteração ou problema do sistema de filtração, independentemente de qual seja a sua origem. “Por ser o primeiro a revelar possíveis problemas, é comum que ele sempre seja apontado como a causa de um problema, por passagem de pó ou saturação precoce, e é comum também acreditar que a solução sempre será apenas fazer a troca dele. Esse tipo de pensamento, porém, pode ser enganoso, pois, na maioria das vezes, o problema revelado no filtro é apenas um sinal de que algo pode estar errado no sistema” – aponta Zocchio.
Contato das empresas
Fibertex: www.fibertex.com.br
Interfiltros: www.interfiltros.com.br