Estudo Multifatorial Da Velocidade De Limpeza Em Não Tecidos Por Metodologia Vdi 3926
Por Me. Luciano Ceron, Drª San
Edição Nº 54 - Janeiro/Fevereiro de 2012 - Ano 10
O objetivo deste trabalho foi avaliar o desempenho de filtração de três tipos diferentes de não tecidos (poliimida aromática, poliéster e poliacrilonitrila copolímero) em aparelho simulador de filtragem ETS.
O meio filtrante mais utilizado para sistemas de particulados é um feltro permeável, também conhecido por não tecido, que tem como função reter as partículas sólidas no início da operação, deixando passar o gás filtrado.
O não tecido é um têxtil com distribuição aleatória das fibras, ou seja, sem um entrelaçamento ordenado e homogêneo dos fios, como mostrado na Figura 1-a. Com características diferentes de um tecido trançado, Figura 1-b, em que o conjunto de fios faz um ângulo próximo de 90º, em forma de lâmina flexível (Moroni, 2005).
Como consequência desta diferença estrutural, os não tecidos limpos são mais eficientes que os tecidos trançados limpos. No processo de formação da torta, a limpeza em tecidos trançados pode eliminar completamente a camada superficial da torta, o que diminui a eficiência da filtração. Este problema é mais difícil de ocorrer em não tecidos, pela grande quantidade de partículas retidas no interior do têxtil após a limpeza (Theodore; Buonicore, 1998). Os tecidos trançados são geralmente utilizados em sistemas de filtração que operam com baixas vazões de ar e que utilizam limpeza por fluxo de ar reverso ou vibração mecânica (Rodrigues, 2004). Os tecidos não trançados, são mais apropriados para filtros com sistema de limpeza por jato pulsante, devido a alta energia para limpeza e alto fluxo operacional de gás (Tanabe, 2008).
As menores partículas da distribuição controlam muitos aspectos dos ciclos de filtração, pois são elas que penetram no tecido no início da filtração e formam a torta de filtração subsequente (Wakeman, 2007). As partículas de maiores diâmetros efetuam um recobrimento menos eficiente das fibras, resultando em menor queda de pressão (Aguiar et al., 2008). A Agência de Proteção Ambiental (EPA; ) implementou em 1995 nos Estados Unidos o programa Environmental Technology Verification (ETV), para gerar dados independentes e confiáveis de novas tecnologias de controle industrial de filtração. Foi adotado um aparelho de testes com base na norma VDI/DIN 3926, para medir o desempenho dos meios filtrantes na remoção de partículas finas até diâmetro de 2,5 μm (MP2,5), juntamente com queda de pressão e as exigências de limpeza em produtos comercias prontos (Trenholm et al., 2008). São necessários no mínimo 100 ciclos de filtração para chegar ao comportamento estável de pressão, mas pode chegar a 1000 ciclos, dependendo da carga de pó (Associação de Engenheiros Alemães, 2003). As alterações nos ciclos podem ser notadas em período de 5 a 10 segundos (Aguiar et al., 2008).
A limpeza é uma das questões mais importantes na operação de filtros de tecidos, pois a limpeza inadequada ocasiona o acréscimo da queda de pressão residual. Entretanto, uma limpeza muito vigorosa pode danificar o filtro, reduzindo o tempo de vida útil do mesmo (Lora, 2002).
O aumento da espessura da torta resulta em um acréscimo da perda de carga do sistema, tornando necessária a limpeza periódica do filtro para remover a mesma e manter a perda de carga em níveis adequados de operação (Rocha, 2010). A perda de pressão é determinada pela diferença de pressão entre dois pontos do filtro, medido na entrada e na saída, após ser filtrado pelo meio filtrante (Seville, 1997).
O aumento da temperatura provoca modificações nas propriedades dos gases (viscosidade e densidade) e na estrutura da fibra de não tecidos (dilatação e encolhimento), alterando a permeabilidade e a eficiência de coleta em não tecidos (Innocentini, 1997). No Quadro 1 são apresentados os efeitos do aumento da temperatura para os principais mecanismos de coleta de particulados, onde a eficiência de coleta é diminuída para a impactação inercial.
Os resultados descritos neste artigo fazem parte de um trabalho de doutorado desenvolvido no programa de Pós-Graduação de Engenharia e Tecnologia de Materiais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PGETEMA/PUCRS.
O material particulado utilizado nos experimentos foi o polietileno de baixa densidade (PEBD), fornecido pela Braskem, Polo Petroquímico de Triunfo (RS).
Realizou-se um peneiramento prévio em peneiras ROT-TAP, modelo Coarse, de 200, 230, 270, 325, 400, 500 e 635 mesh, que corresponde respectivamente a uma abertura com 75, 63, 53, 45, 38, 25, 20 µm. Os particulados usados para o teste foram retidos no fundo do último prato, menores de 20 µm, para novo processo de peneiramento em equipamento Microorifice Uniform Deposit Impactor - Nano Moudi. O equipamento é um impactador de cascata em estágios, com placas rotativas para ocorrer à deposição uniforme em áreas circulares de aproximadamente 25 mm de diâmetro. Cada estágio possui uma placa de impactação para o estágio precedente e uma de orifícios para o mesmo. Pela rotação alternada dos estágios, a deposição é distribuída uniformemente, devido a um jato de ar que atinge a placa de impactação. O fluxo de ar usado foi de aproximadamente 22 lpm. Os filtros são de policarbonato com espessura 8 μm (Nuclepore®). Foi usado quatro estágios de retenção dos particulados com abertura de 2,5; 1,8; 1,0 e 0,56 μm. Os particulados usados no simulador ETS foram aqueles que ultrapassaram o primeiro estágio, os menores que 2,5 μm.
O ensaio de desempenho de filtração em não tecidos de poliacrilonitrila copolímero (PAN), poliéster (PES) e poliimida aromática (PI) foi realizado conforme a norma ASTM D6830-02. A filtração e as condições de limpeza foram adaptadas à partir da norma VDI/DIN 3926, para simular as condições que prevalecem nas operações reais de filtração.
O equipamento Simulador de Filtragem ETS - modelo GmbH (Figura 2), controla o tempo de filtração, número de ciclos de filtração, pressão residual média, temperatura do gás, massa total retida e massa total passante. O gás utilizado foi ar comprimido normal e aquecido em duas corridas distintas, para medir a influência térmica na filtração dos particulados menores que 2,5 μm. Para cada tipo de não tecido foram utilizados cinco corpos de prova em cada variação da velocidade de limpeza. As variáveis controladas foram:
• Taxa de alimentação de pó: 0,03 g/s;
• Velocidade do pulso de entrada de particulado: 8,3 cm/s;
• Velocidade do pulso de limpeza: 7, 12 e 17 cm/s;
• Temperatura do gás a frio: 25±1ºC (para todos os tipos de não tecidos);
• Temperatura do gás a quente: 115±1ºC para a PAN, 150±1ºC para o PES e 240±1ºC para a PI.
Durante o teste duas bombas a vácuo mantêm constantes as velocidades de fluxo de ar na entrada e no sistema de limpeza, por duto com diâmetro de 150 mm. A taxa de particulados é continuamente medida e registrada em unidade de controle de alimentação de pó. A escala tem uma leitura contínua, com uma resolução de 10 gramas. Um sensor de imagem óptico acompanha a opacidade da poeira e do ar, para verificar se o sistema é estável durante todo o período do teste. O gás pode ser aquecido em uma unidade de aquecimento por resistências elétricas distribuídas em varias partes do duto. O controle dos particulados foi realizado após a filtração (massa passante) e na parte inferior do duto (particulado que venceu o fluxo de gás). O sistema de aquisição de dados é constituído por um microcomputador provido de uma placa de aquisição de dados, que permite a leitura por sensores externos. Os experimentos foram controlados por software em Visual Basic 4.0, instalado para os registros das variáveis de interesse.
O mecanismo de filtração é por impactação inercial, batida direta dos particulados sobre as fibras da amostra colocada no sentido transversal da tubulação do equipamento. Um termopar monitora a temperatura do gás no momento da filtração dos particulados (Figura 3).
Cada teste de simulação consistiu de três etapas seqüenciais:
carregamento de poeira continua, formando um bolo de poeira para adequar o têxtil, até atingir aproximadamente uma diferença de pressão inicial de 1000 Pa. Neste ponto, o filtro é limpo por um pulso de ar comprimido em fluxo reverso, fazendo a pressão oscilar rapidamente dentro do duto do teste e estabilizar após aproximadamente 3 segundos do pulso de limpeza.
carregamento contínuo de pó, seguidos de 10000 ciclos de pulsos rápidos de limpeza a cada 5 segundos. A limpeza em ciclos de curto tempo contribui para um alto estresse na resistência mecânica do não tecido, em comparação com as condições normais de uso em filtro cartucho, contribuindo para um rápido envelhecimento do material. Os períodos de recuperação são monitorados e registrados continuamente ao longo do teste.
teste de performance da filtração em não tecido, gravado em 14 horas de duração com ciclos de limpeza e carregamento de poeira constante. As concentrações de poeira expelidas são medidas até 2,5 μm de diâmetro aerodinâmico, assim como o ganho de peso de cada substrato, medido em balança analítica. A eficiência de retenção (ER) do não tecido é determinada em função da massa passante e da alimentação total de pó, conforme a Equação que segue:
Onde mp é o peso total de particulados e mr é o peso de material passante.
Foi usado o software estatístico SAS - versão 9.2, para análise dos dados do planejamento experimental pela Análise de Variância com três fatores (ANOVA), a fim de comparar os níveis de têxtil (3 níveis), velocidades de limpeza (3 níveis) e temperatura (2 níveis). A aplicação da ANOVA foi para verificar se existe diferença significativa entre as médias dos grupos neste delineamento experimental multifatorial 3x3x2. Devido à heterogeneidade das variâncias, utilizou-se a técnica de ponderação pelo inverso da variância através de mínimos quadrados ponderados.
Utilizou-se a análise por MEV para a caracterização das fibras e poros dos não tecidos de PI, PAN e PES. Foi realizado no Centro de Microscopia Eletrônica da PUCRS em um equipamento de microscopia eletrônica de varredura Philips, modelo XL 30, com tensão de aceleração de 20 kV. O preparo inicial dos corpos-de-prova foi realizado em metalizadora Bal-Tec, modelo SCD 005, por metalização com ouro nas amostras de fibras, não tecidos e resinas. As imagens dos parâmetros de construção dos não tecidos foram obtidos com o auxílio do software ImageJ, para calcular a média e o desvio padrão das fibras e poros.
A análise acumulativa em peso (%) e o tamanho médio de partícula (Dp50) em 1,3 µm são apresentados na Figura 4.
Os resultados são apresentados nas Figuras 5 a 10, onde a influência da perda de carga nos 10000 ciclos de limpeza com diferentes velocidades de limpeza (7 cm/s, 12 cm/s e 17 cm/s) e na temperatura do gás normal e a quente. A Figura menor interna no gráfico identifica a fase inicial de cada modo de limpeza, período de compactação e formação da camada de pó.
Os primeiros ciclos de limpeza mostram um comportamento semelhante de filtração em profundidade para a PAN e PES, até aproximadamente 300 ciclos, quando começa a formação da camada de pó superficial, estabilizando a perda de carga do sistema. Esta saturação com maior queda de pressão da PAN e PES é justificada pela abertura maior dos poros nestes dois não tecidos, verificados por MEV (Figura 11 e 12). Portanto, necessitando de um número maior de ciclos de limpeza até o começo da filtração superficial. Já para a PI a estabilização da pressão ocorreu com 250 ciclos de limpeza, pois além da estrutura dos poros serem mais fechadas, a geometria multilobal da fibra retém mais eficientemente os particulados, pela maior área de contato entre fibra/partícula (Figura 13). A maior elevação de pressão no final do teste para o PAN e PES, comparados a PI, confirma a condição de maior acúmulo de particulados internamente no não tecido.
A segunda fase nos gráficos é identificada como filtração superficial, com perda de carga estabilizada entre 300 a 2000 ciclos de limpeza. Neste período é a camada de torta de pó que realiza a filtração, não mais no interior das fibras do não tecido, por já estarem saturadas de pó. A menor velocidade de limpeza, 7 cm/s, apresentou a maior perda de carga, devido a provável deficiência na retirada dos particulados aderidos superficialmente. Isso levaria a acreditar que o saturamento fosse ocorrer em menores ciclos de limpeza, o que na prática não se confirmou, ocorrendo a estabilização da pressão praticamente no mesmo número de ciclos. Este comportamento também foi observado no trabalho de Tieni (2005) em que foi constatado que analisar somente a massa retida não justifica o comportamento apresentado pela perda de carga residual.
O último período de filtração entre 2000 a 10000 ciclos é a fase de aumento constante de perda de carga com comportamento linear de curva, devido ao acúmulo superficial de particulados. A filtração superficial tem a característica de acumular maior quantidade de partículas durante o processo de filtração, e consequentemente, torna mais fácil a remoção de partículas durante o processo de limpeza e aumento de perda de carga progressivo. A perda de carga residual está correlacionada ao acúmulo de partículas sobre a camada superficial do meio filtrante, pois a filtração não ocorre mais internamente.
A filtração a quente apresentou menor oscilação de perda de carga, porém maior perda de carga residual ao final do ensaio, devido a característica do particulado ser material plástico. Pode-se concluir que ocorreu aglutinação entre as partículas de PEBD dificultando a limpeza, principalmente com a PI quente em 240ºC, conforme mostra a Figura 14.
As médias e os intervalos de confiança de 95% para massa retida no ensaio de simulação para os três tipos de materiais, a frio e a quente, em três velocidades diferentes de limpeza são apresentados com os seus respectivos desvios padrões na Figura 15.
Os resultados mostram que não ocorreu diferença significativa em relação à deposição de massa entre os grupos listados:
• PAN frio 7 x PAN quente 7
• PAN frio 12 x PAN quente 12
• PAN frio 17 x PAN quente 17
• PES frio 12 x PES quente 12
• PES frio 17 x PES quente 17
Todas as outras comparações possíveis diferem significativamente do nível de significância de 0,05. Para o têxtil de PI as médias variam em relação ao PES e PAN, mostrando um nível sistematicamente mais alto para a massa retida nas diferentes combinações de velocidades de limpeza e temperatura.
A Figura 16 mostra a eficiência de retenção dos materiais a frio e quente, nas três velocidades de limpeza. Ocorreu maior retenção de particulados na PI, com 7 cm/s a frio, valor médio de 29,032 g de PEBD e eficiência de retenção de 99,96% Este valor de eficiência para a PI se enquadra dentro das necessidades para ser utilizada como não tecido para filtração de particulados. A filtração a quente pelo mecanismo de impactação inercial teve uma menor eficiência, devido às condições de viscosidade e densidade do gás que mudam a quente.
Para os três tipos de não tecidos estudados as melhores condições de filtração de particulados de PEBD até diâmetro de 2,5 μm, foi na condição a frio, com maiores valores de eficiência para a PI, obtida em velocidade mais baixa de 7 cm/s.
A condição de maior perda de carga em velocidade de limpeza de 7 cm/s, comparada com 12 e 17 cm/s, não deve ser considerada como problema, pois o excesso de limpeza é prejudicial ao têxtil, não deixa formar o acúmulo superficial de particulados e diminui a vida útil do elemento filtrante devido ao ciclo abrasivo do ar.
Engenheiro Químico (PUCRS), Doutorando Engenharia de Materiais (PUCRS), Mestre Engenharia de Materiais (polímeros/não tecidos - PUCRS), Especializações em Gestão Ambiental (GAMA FILHO) e Gestão Empresarial (UFRGS). Tem experiência nas áreas: petroquímica (polipropileno, polipropileno aditivado, PET, borracha sintética, etil-benzeno), têxtil (fabricação de não tecidos, mangas filtrantes, palmilhas, persianas de não tecidos e plásticas em PVC), calçados, papel e celulose, tratamento de água e efluentes, tecnologia da informação, logística por software e professor. Ceron.Luciano@gmail.com (55) 51-9972.6534 |
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