Filtragem De Combustível: Protegendo O Motor Diesel
Por Christine Stanfel
Edição Nº 44 - Maio/Junho de 2010 - Ano 8
Atender aos requisitos mais exigentes para emissão de motores diesel implica no uso de equipamento de injeção de combustível mais sensível à contaminação
Atender aos requisitos mais exigentes para emissão de motores diesel implica no uso de equipamento de injeção de combustível mais sensível à contaminação. A obrigação da redução do enxofre e da utilização do biodiesel, induzem a falhas crônicas no campo dos separadores óleo-água, que ainda não estão projetados conforme os padrões de teste da indústria. Este artigo, escrito por Christine Stanfel, da Ahlstrom, considera as barreiras à proteção dos motores diesel impostas pelos combustíveis atuais.
A Agência Americana de Proteção ao Meio Ambiente (EPA), emitiu normas para emissão de motores diesel serviço pesado novos, primeiramente para os modelos 1974. Desde então, os níveis objetivos de emissão foram gradualmente reduzidos. No documento 2007 Heavy Duty Highway Diesel Rule, a EPA reduziu as emissões de particulado (PM2.5) e óxido de nitrogênio (NOx) em 90% e 92% respectivamente, com uma redução adicional de 3% dos níveis de NOx em 2010. Na época de sua publicação, foi considerado necessário o pós-tratamento da exaustão sensível ao enxofre para atingir os níveis de emissão de 2007. Como resultado, o documento 2007 Highway Rule também exige que os níveis de enxofre no diesel caiam 97%, chegando a 15 ppm.
Para atingir os requisitos mais exigentes de emissão, os fabricantes de equipamento original (OEMs) se basearam cada vez mais no equipamento de injeção de alta pressão tipo common rail. A temperatura de combustão e a queima completa, agentes fundamentais das emissões de particulado e NOx, são manipulados no common rail através de medição precisa, tempo de injeção e atomização do combustível. Nesses sistemas, os volumes de injeção são da ordem de microlitros (um milionésimo de litro). As injeções ocorrem em intervalos de milisegundos e as pressões de injeção situam-se na faixa de 30.000 psi. Os orifícios de injeção e as folgas de operação são da ordem de alguns mícra.
As altas pressões de operação e as tolerâncias micrométricas tornam os sistemas de injeção vulneráveis à contaminação e dependentes de um nível mínimo de lubrificação. A água é o principal contaminante em relação à corrosão dos componentes de aço e ao crescimento microbiológico. Ambos os fatores interferem claramente na durabilidade e desempenho de qualquer injetor diesel. Por esta razão, alguns fabricantes de injetores limitam o teor de água dissolvida no combustível a 200 ppm, com tolerância zero para água livre. Esta exigência foi adotada em 2005 pela União Européia na especificação para diesel EN 590.
A separação da água emulsionada do óleo diesel é uma exigência recorrente para a operação de motores diesel. A remoção de água é feita por um filtro separador combustível-água montado no sistema de combustível do motor. O meio filtrante típico encontrado em tais separadores é uma barreira hidrofóbica, como a celulose tratada com silicone. Este meio separa a água na superfície repelente. A água no combustível é rejeitada e se agrupa em gotículas à montante do meio filtrante. À medida que a água é rejeitada, as gotículas coalescem em gotas maiores e são drenadas para um copo coletor. Um outro meio filtrante de bom desempenho é a mídia de profundidade coalescente hidrofílica como a fibra de vidro. Este material tem alta afinidade com a água. À medida que a água do combustível encontra a mídia, ela se associa com as fibras acumulando mais água com o tempo e formando grandes gotas. A água se move através do filtro com o combustível. No lado à jusante, a água separa-se do fluxo de combustível acumulando-se em um copo coletor devido à sua densidade mais elevada, enquanto o combustível seco sobe em direção à saída do filtro. A remoção efetiva de água é considerada fundamental para a preservação do sistema de injeção de combustível e, dessa forma, para atingir os objetivos de redução de emissão.
Acontecem freqüentemente resultados inesperados quando uma alteração é feita em uma especificação de matéria-prima. A indústria do diesel é repleta de exemplos de imprevistos que se desdobram em áreas aparentemente não relacionadas a ações tomadas para se atingir um determinado nível de emissão. A transição para o diesel com enxofre ultrabaixo (ULSD) não é exceção. De forma a atingir os níveis exigidos de enxofre, ULSD é submetido a uma hidrodessulfurisação, um passo de refino que remove não apenas o enxofre, mas também espécies do tipo non-wax da fração de diesel. O resultado é um combustível ultralimpo. Infelizmente, é um combustível ultralimpo do qual foi extraída sua capacidade de lubrificação original.
A capacidade de lubrificação do combustível é crítica para se atingir os níveis de emissão desejados, uma vez que protege o sistema de injeção contra desgaste catastrófico, assegurando controle preciso da combustão. A capacidade de lubrificar do combustível é também fundamental para a operação básica do motor. Um sistema de combustível deve manter a pressão de forma a injetar combustível no cilindro. Os vazamentos induzidos por desgaste podem levar à falha do motor devido à falta de combustível. A incapacidade crônica do ULSD em atingir os requisitos de resistência ao desgaste levou a indústria a adicionar aditivos como os de aumento de lubrificação, inibidores de corrosão e agentes antidesgaste para restaurar a lubricidade necessária.
À medida que as deficiências de lubrificação apareceram com o uso dos primeiros protótipos de ULSD, o biodiesel começou a ocupar seu lugar no mercado norte-americano de diesel. O biodiesel é uma mistura de ésteres metilicos de ácidos graxos (FAME), derivados de uma reação catalisada por básicos entre metanol e gorduras de plantas /animais. O biodiesel melhorou a lubrificação no ULSD e, como resultado, gerou um ímpeto independente para seu uso como um componente de mistura para o diesel. Entretanto, os atributos político e social do biodiesel foram os primeiros agentes para sua incursão nos mercados de diesel.
A escalada dos preços do petróleo, a percepção da necessidade de fornecimento de um combustível "verde" ou doméstico, e a pressão para minimizar as emissões de carbono fossilizado, dispararam ações dos governos estaduais e federal para incentivar ou simplesmente obrigar a inclusão do biodiesel nas misturas de diesel. Por exemplo, Washington exige 2% de biodiesel em todas as misturas de diesel, com um aumento para 5% no caso de produções dentro do estado. Infelizmente, essas expectativas foram postas em prática sem uma avaliação completa do impacto do biodiesel nos equipamentos que queimam a mistura obrigatória.
Da mesma forma que a hidrodessulfurização produziu efeitos colaterais não previsíveis na capacidade de lubrificação do diesel, os aditivos e biodiesel criaram um resultado não óbvio, mas igualmente perigoso: falha dos separadores combustível-água. Resumindo, misturas ULSD contendo suficiente aditivos melhoradores de lubrificação para cumprir as exigências de desgaste, e misturas ULSD contendo biodiesel, criam condições em que os separadores combustível-água comerciais falham em remover 40-100% da água entranhada no combustível. O aspecto insidioso deste efeito colateral é que não há forma do operador saber que esta situação está acontecendo. Diferentemente dos filtros de partículas, que geram um diferencial de pressão excessiva antes da abertura do by-pass que alerta o operador sobre o fim da vida do filtro, não há nada que comunique ao operador que o separador combustível-água não está removendo água.
Os separadores combustivel-água dependem do operador ou de uma válvula automática para esvaziar a câmara coletora de água quando ela está cheia. Se a câmara coletora não enche, não é uma indicação de falha do separador combustivel-água; é muito mais uma indicação de combustível seco. O resultado é que o separador vai permitir a passagem contínua de água para o sistema de injeção sem o conhecimento do operador, em detrimento das superfícies e orifícios sensíveis à água.
A causa raiz da falha do separador combustivel-água em misturas ULSD e ULSD-biodiesel, é o aumento da surfactância do combustível. Apesar de receber nomes diferenciados, inibidores de corrosão, melhoradores de lubrificação, aditivos antidesgaste e biodiesel podem todos ser agrupados em uma única família molecular: surfactantes. Combustível e água são espécies que normalmente não se dissolvem entre si; se forçados a coexistir, são mais estáveis como camadas separadas, com a camada de combustível por cima da camada de água. A intensidade com que as camadas se repelem é medida como tensão interfacial (IFT). Se misturadas, uma emulsão é formada, onde água existe transitoriamente como gotas suspensas no combustível. Surfactantes são moléculas únicas no aspecto em que formam associações fortes tanto com o combustível quanto com a água. Quando surfactantes estão presentes no combustível, eles se associam com a água e aumentam a compatibilidade combustível-água. A maior compatibilidade reflete-se na diminuição da tensão interfacial entre os dois fluidos. Este comportamento surfactante único permite que mais água esteja dissolvida no combustível.
Além de permitir a dissolução de mais água no combustível, a ação dos surfactantes na inoperância dos separadores combustível-água pode ser resumida com três parâmetros: tamanho, estabilidade e superfícies. Quando um combustível contendo surfactantes é misturado com água, a emulsão resultante tem uma distribuição menor de tamanhos de partículas em comparação com uma emulsão isenta de surfactantes. Isso é devido à diminuição da tensão interfacial do surfactante.
Todo meio separador combustível-água atua baseado na interação física entre as gotas de água e o meio físico para fazer a separação. Surfactantes criam gotas de água suficientemente pequenas que podem passar através do meio filtrante sem interação física. Surfactantes também estabilizam a emulsão, dificultando a separação e de forma que as gotas que atingem o meio filtrante estão menos sujeitas a se separarem do combustível e passarem para o meio filtrante. Além disso, as gotas que atingem outras gotas resistem a coalescer em gotas maiores, que são necessárias para uma separação bem sucedida.
Finalmente, surfactantes associam-se com superfícies do meio filtrante e com gotas de água e interferem com as interações únicas entre o meio filtrante e a água, que desestabilizam a água dentro do combustível e permitem a separação. Coletivamente, o resultado de misturar aditivos e biodiesel em ULSD é a inoperância do separador combustível-água e a passagem de água para a tubulação de injeção.
Dispositivos de separação combustível-água devem provar ser eficientes em testes padronizados da indústria. Testes de separação de água envolvem misturar uma quantidade precisa de água no combustível e passar a emulsão resultante através do dispositivo de separação. É medido a intervalos regulares o teor de água à montante e à jusante do dispositivo e é calculada a média ponderada no tempo da eficiência de remoção de água. Testes de remoção de água são em geral tudo ou nada, sendo que a maioria dos consumidores finais exige pelo menos uma separação média de 95% de água para qualquer dispositivo comercial.
É com testes padronizados que outra conseqüência imprevista dos combustíveis obrigatórios vem à tona: falta de correlação com desempenho em campo. Apesar das expectativas de alta performance, o consumidor final está desavisado sobre a alarmante consistência de falhas de sistemas de desidratação de combustíveis em misturas ULSD e ULSD-biodiesel. Isso acontece porque o tempo necessário para um organismo legislador obrigar a inclusão de 2% de biodiesel no diesel é proporcional ao tempo necessário para adaptar testes padronizados aprovados pela indústria para um novo combustível.
Independentemente do processo escolhido, há atualmente diferenças básicas entre métodos de surfactância de combustível e emulsificação encontrados no campo versus aqueles especificados em procedimentos de testes padronizados projetados para avaliar a performance do separador de água. Ambos os comitês ISO e SAE estão trabalhando para adaptar procedimentos para misturas de alta surfactância. Enquanto este trabalho não estiver concluído, o resultado é uma superestimativa desconcertante da capacidade de desempenho quando medida em testes padronizados em relação à performance em campo.
Para ilustrar este ponto, considere a surfactância do combustível. A surfactância do combustível determina a distribuição do tamanho das partículas de água, como também a estabilidade destas gotas e da sensibilidade da superfície separadora. Dessa forma, é determinante na chave do sucesso ou falha de um dispositivo de separação de água. A tensão interfacial (IFT) é sensível ao conteúdo surfactante do combustível, aonde um valor baixo é indicativo de surfactância aumentada.
Cada um dos procedimentos publicados de testes padronizados atuais para separação de água, SAE J1488, SAE J1839, e ISO 4020, especifica apenas uma faixa de IFT para o combustível, permitindo a necessária flexibilidade no teste do combustível para considerar as variações regionais e sazonais. Entretanto, a faixa de IFT especificada em cada procedimento, 25-30 dynes/cm (SAE J1488, 1839) e 23-28 dynes/cm (ISO 4020) não mais representa a IFT tipicamente encontrada em amostras de campo de ULSD, as quais podem variar entre 9-25 dynes/cm e misturas ULSD-biodiesel que ficam na faixa de 8-15 dynes/cm. Nos seus estados atuais, os procedimentos de teste citados - na melhor das hipóteses - especificam combustíveis que representam a faixa de separação de água menos desafiadora disponível em diesel nos EUA e Europa, e ignoram totalmente as misturas de biodiesel.
O descompasso entre níveis de surfactantes em combustíveis de campo e as tensões interfaciais especificadas em normas ativas, cria uma situação bizarra onde testes de laboratório devem pré-tratar os combustíveis a serem testados para reduzir a surfactância - fazendo-os parecer combustíveis obsoletos pré-2007 – de forma a executar os testes padronizados como especificado. Esta prática diminui a severidade do teste e infla a performance observada do separador testado. Alguns testes de laboratório baseiam-se no pré-tratamento do combustível como uma ferramenta importante para permitir a diferenciação entre projetos de separadores que, de outra forma, iriam falhar consistentemente com os combustíveis atuais disponíveis comercialmente.
Além disso, as normas ativas não requerem reportar o combustível com a publicação do resultado, dando ao consumidor pouca informação a respeito do combustível utilizado para gerar o resultado informado. A não ser que o produto especificamente reivindique capabilidade em misturas biodiesel, o usuário deve esperar que a capacidade de remoção de água reportada em um teste padronizado seja baseada no teste como especificado, o que significa que o teste foi executado com um combustível de baixa surfactância, o qual é agora obsoleto.
A lamentavelmente consistente falha dos atuais sistemas de remoção de água em ULSD e misturas ULSD-biodiesel, catalisou um amplo leque de esforços de desenvolvimento para separadores de água independentes. As inovações na área de coalescência e separação vão de sistemas completos de separação a mídias separadoras. Os sistemas envolvem múltiplos tipos de mídia, elementos de múltiplas mídias e mídias de múltiplas camadas. A inovação freqüentemente envolve o empacotamento da mídia e o escoamento da emulsão em novas maneiras. O retorno desta abordagem é a complexidade, que se traduz diretamente em custos de manufatura e matéria-prima. Os mesmos fatores que elevam a complexidade e os custos, também limitam a aplicação universal da solução.
A Ahlstrom Filtration tem um compromisso de longa data em atender às necessidades de filtração de diesel e lançou um programa de desenvolvimento de mídia especificamente voltado para a deficiência da capacidade de separação combustível-água em combustíveis pós-2007. O programa objetiva uma solução universal para separação de água, dividida em partes. O primeiro alvo foi uma mídia de separação de água capaz de enfrentar o ULSD apenas. A segunda parte ampliou as exigências de desempenho da mídia para incluir ULSD como também qualquer mistura com biodiesel, proporcionando ao consumidor uma série de possibilidades.
A solução de mídia Ahlstrom para separação de água de ULSD envolve mídias compostas. Através da união de mídia meltspun de elevada área superficial
Ahlstrom FineFibre com mantas hidrofóbicas fabricadas pelo processo wet laid, foi desenvolvida uma barreira composta com capacidade de remoção de água superior a 95% para todos os USLD e misturas USLD-biodiesel, exceto os de surfactância mais alta. A linha de produto composto FineFiber, cobre uma faixa de eficiências de remoção de partículas e capacidade de retenção de contaminantes, dando ao consumidor flexibilidade em ajustar a mídia à necessidade da aplicação.
A Ahlstrom está também se preparando para comercializar uma mídia coalescente de área superficial ultra elevada para remoção confiável de água em qualquer combustível comercial, incluindo misturas biodiesel. Esta nova mídia coalescente proporciona uma eficiência de remoção de água mínima de 90% para misturas com 20% de biodiesel (B20). Em misturas com 7% de biodiesel (B7), a eficiência de remoção de água sobe acima de 95%, sob as mesmas condições de teste. Biodiesel contendo emulsões deixa a mídia na forma de combustível limpo e brilhante, sem evidência de água livre. Água deixa a mídia na forma de gotas que se sedimentam, separando-se do fluxo. Proporcionando este nível de remoção de água, a mídia permite atender a EN 590 (2005). A mídia pode ser customizada para exigências especificas de vida e durabilidade, sem comprometer a capacidade de separação de água ou compatibilidade com tecnologias de conversão.
Desde 2007, o diesel sofreu um substancial aumento do conteúdo surfactante, que levou à inoperância dos separadores combustível-água comerciais. À medida que os comitês trabalham para revisar as normas de teste, de forma a incluir novos combustíveis, os padrões de desempenho da indústria para separação de água permanecem insensíveis à queda da performance do separador, induzida pelo combustível.
As indústrias de filtros e mídias filtrantes responderam com esforços de desenvolvimento, objetivando novos produtos com capacidade de separação em misturas de biodiesel de alta severidade. Juntas, as barreiras compostas e as mídias coalescentes de área superficial ultra elevada da Ahlstrom são desenvolvidas para proporcionar à indústria do diesel, tecnologias de remoção de água capazes de atender aos combustíveis avançados de hoje.
Project Engineer Ahlstrom Filtration, LLC 205 Nebo Road, Madisonville, KY 42431 USA Email: christine.stanfel@ahlstrom.com www.ahlstrom.com Autorização de publicação concedida pela Ahlstrom do Brasil, matéria publicada na revista Filtration + Separation by Elsevier. Tradução: Carlos Thomsem Júnior |