2015, O Ano Que Já Acabou

O Brasil assistiu emocionado aos embates eleitorais do pleito presidencial. Críticas, omissões, desconstrução de candidatos contaminaram as redes sociais, levando alguns a ceifarem de seu convívio conhecidos de longa data


O Brasil assistiu emocionado aos embates eleitorais do pleito presidencial. Críticas, omissões, desconstrução de candidatos contaminaram as redes sociais, levando alguns a ceifarem de seu convívio conhecidos de longa data. Não precisava tanto. De qualquer modo, chegou a hora de definirmos nossas estratégias de atuação diante do novo cenário econômico.
As diretrizes econômicas do governo Dilma versão 2.0, a meu ver, muito mais costurado por conveniência do que por convicção, parecem ter deixado para trás ideias que formatavam a "nova matriz econômica" ou a "política desenvolvimentista voltada ao crescimento econômico e ao bem estar social". Como se qualquer pessoa que não sofresse de psicopatia desejasse estabelecer uma política não desenvolvimentista que objetivasse a estagnação econômica e o mal estar social. Apenas mentes delirantes conseguem aceitar essa divisão tacanha entre os objetivos das políticas. É verdade que alguns eleitores ainda sintam o gosto da ressaca eleitoral estelionatária, sentindo-se traídos pelas promessas repetidas "ad nauseam", orientadas por conselheiros com raso conhecimento de economia, mas PhDs em influenciar a psique de parte da população votante. Mesmo que alguns eleitores ainda se sintam num experimento pavloviano, repetindo mantras que passam ao largo de evidencias empíricas e teorias econômicas que insistem em se provar corretas há mais de 40 anos, é hora de enfrentar a realidade e endereçar a herança do governo Dilma versão 1.0.
Iniciamos 2015 com o setor industrial em declínio, que eliminou 164 mil postos de trabalho em 2014, levado principalmente pelo setor automobilístico, momentaneamente anestesiado pela política distorcida de eliminação do IPI e que agora sofre com uma sobre capacidade. Com um aumento do salário mínimo de 239%, de 2003 a 2013, para um acumulado de inflação de 110%, além de maior carga tributária, o crescimento do setor industrial só seria possível se a produtividade do trabalhador tivesse subido pari passu a essa diferença entre inflação e aumento salarial. Não foi o caso. Custos maiores fazem com que o empresário tente repassar os aumentos para o consumidor final, mas o aumento das importações mostra que bens importados passaram a ser muito mais atrativos em termos de preços e até de qualidade. Daí se percebe o buraco em que as nossas contas externas se meteu. Déficit de US$91 bn em 2014 ou quase 4.2% do PIB.
Como um homem de bem e que crê em Deus, sempre acreditei que fazer o bem é bom, mas a economia é ateia. Mais uma vez, evoco o ilustre economista Milton Friedman: "não existe almoço gratuito". Alguém paga a conta e, neste caso, é o setor industrial, que passa a reverter os benefícios da nova "matriz econômica" com mais demissões.
De outro lado, temos o setor de energia em desarranjo, resultado da MP 579/12, que tentou reduzir à força as tarifas de energia elétrica. Atitude louvável, mas insustentável até para quem domina as noções básicas de oferta e demanda. Já a construção civil, que voou em céu de brigadeiro quando as taxas de juros em termos reais eram quase negativas e a renda do trabalhador crescia, além da sua produtividade, já sente o impacto negativo do ajuste nestas variáveis: maiores taxas de juros, menor crescimento da renda dos trabalhadores, maior restrição de crédito pelos bancos e maior nível de desemprego.
Essas distorções de preços de energia elétrica, gasolina, subsídios de juros (BNDES), aumento dos gastos fiscais, instrumentos do baluarte da nova matriz econômica, mostraram-se absolutamente  insustentáveis. A volta à racionalidade por conveniência do governo Dilma 2.0 tem procurado reverter essas distorções. Não será fácil. Pelo menos nesse ano colheremos mais inflação (aprox. 7.3%), com o desrepresamento de preços administrados e maiores impostos (ex. CIDE), maiores juros (12.75% até o fim do ano),  maior depreciação cambial (R$3.00), menores gastos governamentais e mais impostos.
Em maio/14, em entrevista, alertei sobre a possibilidade de uma tempestade perfeita para o Brasil em 2015 (http://m.infomoney.com.br/mercados/noticia/3375075/atual-governo-criou-tempestade-perfeita-para-2015-afirma-economista-entenda). Estava errado. Não porque o país enfrentará um cenário melhor, mas infelizmente, pior. À época da entrevista, não havia eclodido o escândalo do Petrolão, envolvendo "nossa" Petrobras. Dado que esta responde por 10% do total de investimentos do país e anunciou que reduzirá 30% o nível de investimentos este ano, com claro efeito multiplicador para toda a cadeia do segmento de óleo e gás, é razoável esperar uma nova queda no nível de investimento no país de quase 8% este ano. Pior do que em 2014, quando o nível de investimento caiu 7%.
O cenário é bastante desafiador. Tarifaço, inflação em alta, juros elevados, déficit em conta corrente, ajuste fiscal draconiano com corte de benefícios trabalhistas e aumento de impostos, depreciação cambial, setor elétrico em desarranjo, indústria sem competitividade, aumento do desemprego, petrolão e impactos na cadeia de óleo e gás, possível racionamento de energia e água, menor disponibilidade de crédito e queda da confiança dos consumidores. Como uma retro alimentação desse cenário não deve ser descartada, uma contração econômica para este ano entre 1.2% a 1.4% parece um cenário bem realista.
A alegria de um pessimista é poder constatar que suas projeções estavam erradas. Pode ser. Mas acho que não terei esse prazer neste quadriênio.

2015, O Ano Que Já Acabou


Roberto Dumas Damas
Professor do INSPER e da Fundação Instituto e Administração (FIA). Mestre em Economia pela University of Birmingham (Inglaterra) e Mestre em Economia Chinesa pela Fudan University (China)

 

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