O mercado brasileiro e a indústria automobilística

Onde as regras mudam constantemente e o que valia ontem não vale hoje, mas pode valer amanhã


Então, como escreveu Lee Iacocca, criador do Mustang, ex-presidente mundial da Ford e, posteriormente, também da Chrysler, em seu livro Autobiografia, nunca jogue fora as gravatas usadas, porque a largura e o desenho, superados num determinado momento, podem voltar a ser adotados no futuro.

O mesmo vale para a indústria automobilística, ainda mais em mercados como o brasileiro onde as regras mudam constantemente e o que valia ontem não vale hoje, mas pode valer amanhã. Neste contexto, cabe destacar que os homens erram, mas são esquecidos e deixam a imagem negativa para as empresas.

Ao longo de minha carreira sempre pautei minhas atitudes com respeito à imagem das empresas que representei. Isso, porque tenho a consciência de que os empregados, bons ou maus, são passageiros. Eternas deveriam ser as empresas, cuja história é escrita por cada um de seus empregados.

Um bom exemplo desse tema surgiu nos anos 70, quando enfrentamos a primeira crise internacional do petróleo, que estabeleceu uma nova dimensão para o nosso mundo. E, dentro da crise, estavam as empresas automobilísticas, pela queda acentuada do poder de compra dos consumidores como consequência da incerteza do futuro.

Aqui no Brasil ocorreu o processo de adoção de motores a diesel nos caminhões em substituição aos movidos a gasolina em função da diferença de preços s combustíveis. Por essa necessidade de atendimento à preferência dos consumidores, a Ford precisou substituir o motor V-8 a gasolina que inicialmente equipava os seus caminhões, por unidades a diesel. Isso levou a montadora a desativar a produção dos motores V-8 a gasolina, cujos moldes foram estocados num dos pátios da antiga fábrica do Ipiranga, no bairro de Vila Prudente, na confluência da Avenida Henry Ford com a Avenida Pacheco Chaves.

Logo em seguida surgiu o Proálcool, que levou as empresas a criarem motores a álcool para os automóveis e incentivou a mesma transformação de propulsores maiores, para instalação em caminhões. E, naturalmente, a engenharia da Ford, imaginou recorrer aos moldes dos motores V8 a gasolina estocados no pátio da fábrica para desenvolvimento de uma versão a álcool para a sua linha de veículos comerciais.

Mas, para surpresa dos engenheiros, surgiu a informação de que os moldes não mais existiam, porque o diretor de caminhões da época havia transmitido ordem para que fossem vendidos como sucata, em defesa do "saving" da companhia.

Essa decisão levou a Ford a limitar o projeto de motores a álcool apenas para a sua linha de picapes F-100, com a utilização de uma versão de 6 cilindros e 3,3 litros, produzida na Argentina. Mas, exatamente como ocorreu com outras empresas, o motor a álcool para veículos comerciais da Ford não apresentou os mesmos resultados eficientes como os dos automóveis. E a montadora foi obrigada a recorrer a fabricantes de motores a diesel para equipar os seus caminhões.

Nesse processo, foi a empresa que mais mudou os motores de seus caminhões, inicialmente com os Perkins e, posteriormente, com os de outros fabricantes, como o DDA (Detroit Diesel Allison), da GM, e o FTD (Ford Tratores) e, mais tarde, Cummins para os veículos mais pesados, e MWM para os modelos leves.

Possivelmente, esse diretor de caminhões que deu a ordem par venda dos moldes do motor V8 não deve ter lido o primeiro livro escrito por seu patrão principal, Lee Iacocca. Nesse livro, sobre a sua história na indústria automobilística, Iacocca ensinou que o mundo vive de ciclos, especialmente em termos de moda e, com base neste conceito, confessou que jamais jogou fora as gravatas usadas, porque a largura e o desenho, superados num determinado momento, podem voltar a ser adotados no futuro.


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