Qual a melhor tecnologia para levar a energia elétrica que será produzida nos futuros parques eólicos offshore?
Agência Fapesp -
Trabalho conduzido no Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa da USP também analisará a melhor maneira para levar eletricidade
Agência FAPESP* – Qual a melhor tecnologia para levar a energia elétrica que será produzida nos futuros parques eólicos offshore na costa do Brasil para o continente? E qual a forma mais adequada de abastecer com eletricidade as plataformas de óleo e gás instaladas em águas brasileiras? Um mesmo projeto do Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI) começou a investigar essas duas questões, no âmbito de um programa novo financiado pela empresa de multienergia TotalEnergies.
O RCGI é um Centro de Pesquisa em Engenharia (CPE) constituído com apoio da FAPESP e de empresas na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP).
Vinte pesquisadores, entre docentes, pós-doutorandos, doutorandos, mestrandos e graduandos, trabalharão ao longo de três anos na criação de ferramentas capazes de auxiliar a escolha da tecnologia mais adequada para a transmissão de energia em cada caso.
“O projeto tem dois objetivos distintos, que compartilham um elemento comum: a transmissão de energia pelo mar. O primeiro envolve trazer energia para a costa, a partir dos parques eólicos offshore. O outro vai levar energia da costa para as plataformas de exploração de óleo e gás”, afirma o engenheiro eletricista Renato Machado Monaro, professor da Poli-USP e coordenador do projeto “Investigação das tecnologias de transmissão offshore na costa brasileira aplicadas na exploração de óleo e gás e na integração de fazendas eólicas (TransBRcoast)”. A iniciativa tem também apoio da FAPESP por meio de projeto coordenado por Monaro.
“As duas vertentes têm características diversas. Os parques eólicos offshore serão construídos perto da costa; os projetos preveem distâncias de até 20, 30 quilômetros da praia, boa parte deles ainda na plataforma continental, onde a lâmina d´água é mais rasa. Já as plataformas de petróleo são instaladas onde está o óleo”, explica o professor.
Ele acrescenta que as plataformas brasileiras com estrutura para exploração de petróleo e gás estão situadas em média a 148 quilômetros de distância, com a mais distantes chegando a 300 quilômetros da costa, na bacia de Santos, em águas profundas ou ultraprofundas. A energia consumida nessas plataformas vem do gás do próprio poço de exploração. Ou seja, elas funcionam hoje como um sistema isolado, mas a ideia é descarbonizar o máximo possível a extração do óleo.
No contexto das mudanças climáticas, empresas e países têm trabalhado com um período de transição energética, onde há uma descarbonização gradual das atividades. “Com a eletrificação das plataformas, diminuímos a nossa dependência de petróleo, emitiremos menos CO2 nessa exploração”, diz Monaro. “Talvez no nosso tempo de vida, nós vejamos uma sociedade com bem menos petróleo, mas não acho que ele vá desaparecer.”
Condições brasileiras
Em uma primeira etapa do projeto, os pesquisadores fazem um levantamento dos limites tecnológicos, dos custos dos sistemas e materiais já utilizados em outros países, como cabos de transmissão, transformadores, conversores, entre outros, bem como de perspectivas futuras. Eles também investigam a capacidade de geração dos parques eólicos planejados e o quanto deverão produzir de energia, além de avaliar a quantidade de energia consumida pelas atuais plataformas.
“Em boa medida, o que se tem de saber para o sistema de transmissão é o quanto de energia será transmitido e a que distância”, conta Monaro. O relatório final do projeto será entregue à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e será público.
No caso do petróleo brasileiro, além da distância, os pesquisadores ainda levarão em conta as adversidades trazidas pela profundidade da lâmina d´água nos locais em que são feitas as explorações. “O grande desafio será encontrar a tecnologia mais barata e confiável. Se os sistemas de transmissão são muito caros ou inadequados para a condição do empreendimento, retira-se a atratividade daquele investimento”, afirma o engenheiro.
Tanto para conectar um parque eólico offshore à costa como para integrar a rede às plataformas, serão investigadas três tecnologias. “Cada uma delas tem as suas particularidades e os seus custos. A partir de algumas distâncias, uma tecnologia começa a prevalecer sobre a outra”, diz o coordenador do projeto.
A transmissão em alta tensão em corrente alternada, em frequência convencional (50/60 Hz), corresponde à configuração de maior maturidade tecnológica, segundo os pesquisadores. A distância máxima de transmissão, porém, limita-se a cerca de 50 quilômetros da costa.
Uma alternativa está na redução da frequência, que diminui as perdas de transmissão de energia e, consequentemente, amplia a potência transferida. Conhecida como Low Frequency Alternating Current (LFAC), essa tecnologia consiste na transmissão em corrente alternada em alta tensão com um terço da frequência convencional (16,67/20 Hz).
Nesse caso, é preciso instalar na costa um conversor de potência do tipo CA/CA a fim de alterar a frequência de transmissão antes de conectar o sistema offshore à rede elétrica em terra. Apesar de os estudos na literatura técnica apontarem a tecnologia LFAC como adequada à transmissão em distâncias intermediárias, entre 30 e 75 km, na prática ela só foi aplicada até hoje em sistemas ferroviários na Europa, alerta a equipe do RCGI.
Muitos dos desafios técnicos associados às perdas de transmissão também podem ser superados com a utilização de corrente contínua. Nesse caso, a tecnologia High Voltage Direct Current (HVDC), que é a transmissão em corrente contínua de alta tensão, destaca-se ao poder ser aplicada em projetos de longa distância. No contexto das aplicações offshore, uma rede HVDC demandaria a instalação de estações conversoras de potência CA/CC terrestre e marítima, elevando os custos.
“Para cada uma dessas três tecnologias, há toda uma discussão sobre disponibilidade de equipamento, custo e limites tecnológicos”, conclui Monaro. “Claro que não é um estudo que traz resultados definitivos, mas começa a investigação e traz vetores de avaliação.”
* Com informações do RCGI.