Serragem para bioproduto precisa de investimentos e aumento de escala
Por Cristiane Rubim Edição Nº 129 - Julho/Agosto 2024 - Ano 23 -
O uso da serragem, subproduto de madeireira, como matéria-prima na produção de bioprodutos pode trazer maior lucratividade aos empreendimentos. “Traz aumen
O uso da serragem, subproduto de madeireira, como matéria-prima na produção de bioprodutos pode trazer maior lucratividade aos empreendimentos. “Traz aumento de riquezas e impostos. Além disso, gera emprego e desenvolvimento social” – afirma Washington Luiz Esteves Magalhães, pesquisador da Embrapa Florestas – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.
O uso da serragem diminui o descarte indevido na natureza, que pode contaminar água e solo. “A madeira é biodegradável se as condições ideais de umidade, temperatura e oxigênio forem satisfeitas. Quando a serragem e outros resíduos de madeira ficam acumulados em um único lugar, a degradação do material é incompleta, gerando chorume, que contamina solo e água” – adverte.
Viabilidade
Desafios do uso da serragem como matéria-prima na fabricação de bioprodutos, que são produtos de origem biológica e obtidos por processos biológicos. “Para os bioprodutos, precisamos aumentar a escala dos processos e produtos que ainda estão em laboratório para verificar a viabilidade econômica de produção. Para tanto, precisaríamos de investimentos de empresas privadas e do setor público para o desenvolvimento de processos e produtos sustentáveis” – avalia Washington Luiz Esteves Magalhães
Deve-se levar em conta o momento econômico por qual passamos. “É de se esperar que os investimentos sejam voltados para as biorrefinarias sem a exigência de processos inteiramente biológicos. Neste caso, diversos processos e produtos estão muito próximos de virar uma realidade industrial” – pontua.
Subprodutos
A serragem tem origem no processamento de madeira maciça:
• Desde o desdobro de toras – corte do tronco em tábuas, vigas e caibros;
• Até as operações de corte da madeira aparelhada – peças de madeira com faces aplainadas.
De cada tora de madeira oriunda de plantios florestais processada para uso como madeira maciça:
• Mais de 50% são transformadas em subprodutos: como cascas, pedaços menores, esmoados, cavacos e serragem;
• Entre 20% e 40% das toras se transformam em serragem;
• Se a madeira provém de florestas nativas, o aproveitamento das toras é muito menor, chegando a números menores que 30%, portanto, com maior percentual de serragem;
Para Magalhães, fica evidente que o uso da serragem é vantajoso tanto para maior aproveitamento da biomassa quanto para a sustentabilidade ambiental, econômica e social.
Produção
“Não existem estatísticas sobre o volume de serragem usado para a produção de produtos e muito menos para a produção de bioprodutos no Brasil” – afirma. De acordo com ele, pode-se calcular essa quantidade a partir do volume de madeira consumida:
• A Indústria Brasileira de Árvores (IBÁ) estimou em 8,2 milhões de m3 de madeira serrada em 2022. Se for considerado que 20% desse total se transforma em serragem, calcula-se que 1,64 m3 desse total virou serragem ou mais que meio milhão de toneladas de serragem;
• A Associação Brasileira da Indústria de Madeira
Processada Mecanicamente (Abimci) – https://abimci.com.br/o-setor/ – estimou 700 mil toneladas de pellets para 2021. Esse produto é feito com mais de 100% de serragem. Parte da serragem é queimada para gerar energia para a secagem da própria serragem.
Produto e bioproduto
Segundo Magalhães, embora com a serragem seja possível tecnicamente gerar bioprodutos, entendidos como produtos de origem biológica e obtidos por processos biológicos, na economia brasileira, não existem muitos casos de sucesso que possam servir de exemplos.
Compostagem
O pesquisador cita a compostagem como um dos exemplos de uso da serragem. A compostagem é um processo biológico em que fungos e bactérias degradam a serragem parcialmente, transformando-a em bioproduto, chamado de composto. “O composto é um excelente condicionador de solos e muito usado na agricultura orgânica. Começam a surgir empresas investindo na compostagem a céu aberto, às vezes coberta apenas com lonas jogadas por cima das pilhas de material orgânico, e usando extensivamente no agronegócio como fertilizante após ser enriquecido com pó de rocha. A qualidade do solo manejado com este tipo de bioinsumo é superior ao solo fertilizado de modo convencional, sob todos os aspectos, como os físicos, químicos e biológicos” – aponta Magalhães.
Etanol
Outro exemplo é a produção de combustível como o etanol de segunda geração. “É necessário, primeiro, realizar pré-tratamento na biomassa, especificamente, a serragem. A seguir, expô-la à ação de enzimas que quebram as cadeias de celulose e hemicelulose em açúcares simples que são fermentados a etanol. Embora um processo industrial como este seja tecnicamente possível e com balanço energético favorável, não temos nenhum caso comercial em operação. As usinas de geração de etanol de segunda geração no País utilizam o bagaço da cana de açúcar” – menciona Magalhães.
A celulose é um polímero natural formado de moléculas de glicose e componente da parede celular das plantas. Sua principal fonte é o lenho das árvores de eucalipto e pinus. Tornou-se matéria-prima importante para a produção de papéis, fraldas descartáveis, tecidos, emulsionantes, espessantes e estabilizantes etc. Enquanto a hemicelulose compõe os polissacarídeos que fazem parte de mais de 30% da massa seca dos resíduos das plantas.
Pinus
Algumas espécies florestais, como o pinus, possuem resina com alto teor de fitoesteróis, substâncias gordurosas produzidas pelas plantas. “Nas usinas de polpação de madeira de pinus, esses extrativos, conhecidos com tall oil, são coletados em algum momento do processo e possuem teor elevado de fitoesteróis. São uma classe de produtos com inúmeras aplicações, desde alimentos até no agronegócio. Todavia, o processo de obtenção industrial não pode ser considerado biológico, descartando esse produto como sendo um bioproduto” – enfatiza Magalhães.
Cresceu no Brasil o uso de pinus, madeira sustentável de reflorestamento que substitui a extração de espécies nativas, caso da Araucária. Foram os imigrantes europeus que trouxeram espécies de pinus ao País há mais de cem anos. Por ser leve e crescer rápido, sua plantação é em escala industrial. São mais de 1,5 milhão de hectares, 35% da madeira serrada no Brasil. Pinus é usado por indústrias de madeira serrada, laminada, chapas, resina, celulose e papel. Na construção civil, móveis, chapas compensadas, lâminas decorativas, peças torneadas etc. E ainda tábuas para caixotarias e pellets.
Ingrediente
Abaixo, alguns exemplos do uso da serragem na confecção ou como ingrediente de diversos outros produtos que não se classificariam como bioprodutos, segundo Magalhães:
• O pellet e o briquete: usados para substituir a lenha com vantagem.
Os pellets têm formato de pequenos cilindros. A produção de pellets de madeira pode ser feita de pedaços e restos de madeira de serrarias que são descartados, como: cascas, refilos, lascas etc.
Chamados de “carvão ecológico”, os briquetes resultam da secagem e prensagem dos resíduos de madeira. Após sua transformação, viram combustível que gera calor para fornos e caldeiras. Utilizados em empresas de cerâmicas, alimentícias, pizzarias, hotéis e padarias.
• Biochar e carvão ativado.
Na agricultura, o biochar fixa carbono e melhora a qualidade do solo. Enquanto o carvão ativado é usado como adsorvedor. Resíduos orgânicos, como talos de trigo, esterco ou serragem, aquecidos a temperaturas bem altas sem oxigênio se transformam em biochar. O biocarvão ou biochar é a biomassa carbonizada produzida por pirólise para uso agrícola.
• Compósitos poliméricos: quando misturados com plásticos e usados na construção civil;
• Misturados a resinas fenólicas: produção de moldes de areia ou em backelite;
• Cobertura de solos, substrato para cogumelos etc.
Térmico
Segundo Magalhães, pode-se pensar em processos térmicos e químicos, até mesmo usando os princípios da química verde. “Por rotas térmicas, a pirólise rápida é um processo muito interessante. Com pouco oxigênio, a serragem é aquecida até 500ºC em poucos segundos. Forma-se um líquido, chamado de bio-óleo, com propriedades para ser usado com combustível, principalmente para ser adicionado ao gasóleo – de origem fóssil e de onde se produz a gasolina por craqueamento catalítico – e deixar o combustível de origem fóssil com uma porcentagem de carbono de origem sustentável” – destaca o pesquisador da Embrapa.
O craqueamento catalítico usado na indústria petroquímica converte frações do petróleo mais pesadas em frações mais leves, como a gasolina e o GLP. Por craqueamento, muitos dos subprodutos do petróleo são usados como matéria-prima para produzir plásticos, borrachas e novos materiais.
Lignina
O bio-óleo pode ser usado para várias outras aplicações, não apenas como combustível. O pesquisador cita produtos, como a lignina pirolítica para fabricar fibra de carbono e outras substâncias químicas de alto valor agregado, caso da levoglucosana, composto orgânico formado da pirólise de carboidratos, como amido e celulose. “Além desses produtos, esse processo de pirólise produz o biochar, que já pode ser usado na agricultura, e gás, que pode ser queimado e gerar energia para o processo” – explica.
A lignina, material orgânico natural, é rejeito industrial e de biorrefinarias. A lignina possui diferentes estruturas e propicia a produção sustentável e custo mais barato das fibras de carbono, diminuindo uso de materiais fósseis. Por suas propriedades mecânicas, atende aplicações em diversas áreas.
Processos
A Embrapa trabalha mais com três processos de uso de serragem:
• Para produzir glicose ou bioetanol;
• Com outras fontes de resíduos orgânicos, por exemplo, o esterco, para compostagem acelerada por aeração forçada;
• Como substrato acrescido de fontes de nitrogênio e nutrientes para fermentação submersa ou semissólida para produzir basidiomicetos e lacases, enzimas que degradam a lignina.
Contato da empresa
Embrapa Florestas: www.embrapa.br/florestas
Referências bibliográficas
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