Setor automotivo pode registrar maiores cortes a partir de outubro

De acordo com Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea, MP 936 é ótimo instrumento, mas é temporário


PEDRO KUTNEY, AB

Junho marcou o início de um inevitável novo ciclo de demissões nas fábricas de veículos em todo o País. Segundo dados divulgados pela associação dos fabricantes, a Anfavea, em apenas um mês foram demitidas 1.059 pessoas, queda de quase 1%, fazendo o nível de emprego do setor descer de 125 mil para 124 mil postos entre maio e junho. Na comparação com o mesmo mês um ano antes a retração é ainda maior, de 4%, com 5,2 mil cortes, mostrando que as montadoras já vinham reduzindo seus quadros, principalmente por causa de quedas nas exportações, mas já tinham feito a maior parte dos ajustes e agora, pelo visto, terão de cortar mais.

O número de demissões nas montadoras só não foi maior até agora porque a maioria dos fabricantes adotou reduções de jornada e salários e suspensões temporárias de contratos de até dois meses, previstas na Medida Provisória 936 editada em abril pelo governo, que permite essas ações em troca de dois meses de estabilidade dos funcionários atingidos.

"A MP 936 é um ótimo instrumento, mas é temporário. Entre outubro e novembro, quando acaba a maioria dos acordos de estabilidade (baseados na MP), poderemos ver um maior número de demissões. Se a economia não voltar a crescer e a produção não decolar, não temos como manter o mesmo quadro. Portanto, o emprego está em risco sim", destaca Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea.

Segundo Moraes, em junho apenas uma das empresas associadas registrou número mais elevado de demissões – a Nissan encerrou um turno de produção em Resende (RJ) e demitiu 398 pessoas, assumindo o custo de dois meses adicionais de salários que os funcionários teriam direito por estarem afastados de acordo com as regras da MP 936. “O restante dos desligamentos foi bastante diluído entre as empresas, basicamente com a não renovação de contratos temporários”, afirma o presidente da Anfavea.

O setor iniciou a crise trazida pela pandemia de coronavírus, em março, com o discurso de que as demissões seriam a última das ações a serem adotadas, porque demissões em massa geram grandes despesas para pagar direitos trabalhistas e perda dos valores investidos no treinamento de funcionários. Contudo, a forte retração das vendas provocou ociosidade recorde nas linhas de produção acima dos 50%, o que torna os cortes inevitáveis.

A Anfavea prevê a produção de apenas 1,63 milhão de veículos no País em 2020, o que representa apenas 36% da capacidade técnica instalada de 4,5 milhões de unidades/ano nas fábricas brasileiras. Para piorar, a recuperação vislumbrada será lenta, com a volta dos patamares pré-pandemia de 2019 somente em mais cinco anos à frente, tornando injustificável a manutenção dos mesmos níveis de emprego no setor.

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