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Anfavea vê dificuldades para o futuro do setor automotivo

Gargalos e aumentos de custos para produzir geram incertezas referentes a retomada das produções


PEDRO KUTNEY, AB

Fechado o melhor mês do ano em vendas e produção – melhor inclusive do que vários dos meses que antecederam a pandemia de coronavírus em 2019 e 2020 –, a Anfavea, associação dos fabricantes de veículos instalados no Brasil, avalia que a evolução do mercado reforça suas projeções para este ano, mas adota cautela para prever o futuro próximo de 2021.

Ao divulgar os resultados da indústria em outubro e no acumulado de dez meses na sexta-feira, 6, o presidente da entidade, Luiz Carlos Moraes, apontou que o setor está cercado de gargalos e aumentos de custos para produzir, os estragos da Covid-19 ainda não cessaram e existem muitas incertezas sobre a evolução da economia e da pandemia no próximo ano. Diante desse cenário, não há segurança sobre a continuação do ritmo de crescimento que vem sendo observado nos últimos meses.

"Não vemos grandes riscos até o fim do ano, deve fechar dentro do que projetamos, talvez até um pouco melhor. O que não sabemos é se o crescimento atual veio para ficar ou se é o represamento de vendas que não foram feitas no segundo e terceiro trimestres. Claro que estamos contentes com a recuperação, mas não temos certeza sobre a continuação dessa retomada", avalia Luiz Carlos Moraes.

O dirigente admite que as fábricas enfrentam uma série de gargalos que limitam a produção, seja pela necessária imposição de protocolos para proteger a saúde dos funcionários, ou pela falta de alguns insumos e componentes de fornecedores que não conseguiram retomar as entregas no mesmo ritmo mais forte de reação da demanda observada nos últimos meses. Moraes informa que a indústria está reagindo com medidas paliativas, como horas extras, jornadas aos sábados e contratações temporárias, além de monitorar constantemente a cadeia de logística e suprimentos, mas descarta a abertura de mais turnos de trabalho no momento. “Isso só vai acontecer quando houver certeza que esse crescimento veio para ficar”, sublinha.

Moraes reconhece que a indústria não consegue no momento rodar mais rápido para suprir a falta de alguns produtos no mercado, que deverá ser resolvida gradualmente ao longo dos próximos meses. Esta semana as locadoras de veículos divulgaram que têm pedidos ainda não atendidos de 150 mil carros às montadoras. “Faz parte da dinâmica dos negócios. No segundo trimestre tínhamos muitos produtos em estoque e nenhuma locadora estava comprando, ao contrário, venderam mais de 100 mil carros. Agora não podemos produzir 150 mil veículos de uma vez, temos uma longa cadeia de suprimentos e precisamos programar pedidos com antecedência. Claro que vamos atender, mas precisamos de mais tempo para ajustar a produção”, justificou presidente da Anfavea.

AMEAÇAS NO HORIZONTE

Em contraponto ao aumento da demanda nos últimos meses que aponta para 2021 mais parecido com 2019, a Anfavea trabalha com várias ameaças à frente. A primeira delas é a própria evolução da pandemia, que embora esteja mais controlada segue causando estragos econômicos e ceifando vidas. A alta generalizada de custos, causada tanto pelos preços em elevação das matérias-primas como pela maior desvalorização cambial do planeta que encarece a importação de componentes, é outra preocupação no horizonte que pressiona os preços dos veículos para cima e o mercado para baixo.

Na economia, a tendência é de desemprego crescente, retração de renda e alto endividamento público, que se aproxima de 100% do PIB e pode levar o governo a aumentar impostos para cobrir o rombo. “É muito difícil traçar qualquer cenário e fazer o planejamento do próximo ano sob essas condições”, pondera Moraes.

Do volumoso montante de demandas junto ao governo, que meses atrás Moraes chamou de “elefante a ser fatiado”, houve poucos progressos. Ao menos uma questão foi resolvida: na semana passada o Contran (Conselho Nacional de Trânsito) aceitou adiar em um ano, para 2023, a adoção de sistemas de segurança veicular que seriam obrigatórios em todos os carros vendidos no País a partir de 2022, o que segundo a Anfavea demandaria investimentos inviáveis no momento.

Outra questão encaminhada é a prorrogação em dois a três anos para entrada em vigor das próximas fases da legislação de emissões estabelecida pelo Proconve, que deveriam ser adotadas a partir de 2022. “Já passamos pela fase de esclarecimentos e esperamos a aprovação do nosso pedido”, afirma Moraes. A Anfavea defende que a pandemia exauriu o tempo e os recursos necessários para desenvolver os novos motores e veículos para atender as normas. “Muitos países como China e México estão fazendo esses adiamentos”, destacou.

Também segue em negociação o desenho de um programa de renovação de frota, que teria o duplo efeito positivo de retirar veículos poluentes das ruas e reaquecer as vendas. “Continuamos negociando e é possível que tenhamos novidades sobre isso até o fim do ano”, revela Moraes.

Já a questão dos R$ 20 bilhões em créditos tributários acumulados e devidos pelo governo aos fabricantes de veículos é bem mais difícil de resolver. “Com esse dinheiro estamos financiando o governo sem juros nem correção ou prazo para receber. Como faltam recursos o governo não paga”, reclamou Moraes. A esperança reside em uma emenda incluída recentemente projeto de reforma tributária em tramitação no Congresso, que prevê a transformação dessa dívida em títulos negociáveis. A inclusão foi negociada pela em conjunto com a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e associações representativas de setores que também têm créditos a receber.

MELHOR MÊS DO ANO

O números divulgados pela Anfavea reconfirmaram que outubro foi o melhor mês do ano em vendas de veículos, superando inclusive alguns meses de 2019. No total foram emplacados no País 215 mil automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus, o que revela alta de 3,5% sobre setembro, mas ainda em queda de 15,1% na comparação com outubro do ano passado.

No acumulado de dez meses os licenciamentos de veículos leves e pesados somaram quase 1,6 milhão de unidades, número 30,4% inferior ao observado no mesmo período de 2019, ou cerca de 700 mil emplacamentos a menos do que no ano passado.

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