Anfavea classifica como "razoáveis" os resultados do mercado doméstico em fevereiro

Entretanto, entidade afirma que continuidade da falta de componentes pode afetar a escalada da indústria


PEDRO KUTNEY, AB

Internamente, a associação dos fabricantes de veículos instalados no Brasil, a Anfavea, classifica como “razoáveis” os resultados do mercado doméstico em fevereiro – 167,4 mil emplacamentos de carros, comerciais leves, caminhões e ônibus, em pequeno recuo de 2,2% sobre janeiro, mas significativa retração de 16,7% ante mesmo mês de 2020, mesmo sem o feriado de carnaval este ano – e no primeiro bimestre que soma 338,5 mil unidades emplacadas, em baixa de 14,2% na comparação anual.

O fato é que o mercado brasileiro iniciou 2021 girando ainda bastante abaixo do período pré-pandemia, antes de março de 2020. As vendas de veículos, que em 2019 sempre superaram as 200 mil unidades/mês e chegaram a passar de 260 mil, só voltaram a ficar pouco acima de 200 mil a partir de setembro passado, cresceram até dezembro e voltaram a mergulhar abaixo de 170 mil no primeiro bimestre. O mesmo acontece com a média diária de emplacamentos, quase sempre acima das 11 mil unidades em 2019, só retornaram a esse nível nos últimos dois meses de 2020 e este ano giram em torno de 8,5 mil/dia.

A retração das vendas também não afeta todo o mercado. Enquanto os emplacamentos de automóveis de passageiros (ou de passeio) caíram 19% no bimestre e as de ônibus retrocederam 22,6% em comparação com o primeiro bimestre de 2020, as vendas de modelos comerciais leves aumentou 6,7% e a de caminhões cresceu 11,8%, o que demonstra que os veículos comerciais de carga continuam atravessando melhor a crise.

"Diante dos problemas de falta de componenetes e insumos, alcançamos um bom resultado de produção com quase 400 mil unidades fabricadas, mas é fato que o mercado de automóveis mostra desaquecimento. Mas olhando para frente tenho minhas preocupações se a situção não melhorar", avalia Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea.

CRISE CONJUNTURAL: ESCASSEZ DE PEÇAS E PRESSÃO DE CUSTOS

Entre as maiores preocupações do momento está a falta generalizada de componentes e insumos para produzir, causada pelas interrupções da produção em 2020 seguidas por crescimento da demanda acima da esperada especialmente no último trimestre do ano. O maior potencial de estrago no momento é causado pelo encurtamento no fornecimento global de semicondutores, que além da escassez de suprimentos, no caso brasileiro são 100% importados e para chegar aqui dependem de linhas logísticas desorganizadas pela pandemia.

Segundo Moraes, a Anfavea ainda não mapeou qual será a perda de produção (e consequentemente de mercado) que a escassez de suprimentos vai causar no Brasil este ano, mas reconhece que será inevitável, citando que já estão sendo anunciadas paralisações de fábricas com volumes importantes – caso da GM, que parou a planta de Gravataí (RS) este mês e deverá voltar em abril com ritmo mais lento com funcionários afastados em layoff (leia aqui).

O dirigente lembrou que por causa da falta de semicondutores os analistas já projetam uma quebra potencial de 3% na projeção global de produção de veículos este ano, que estava prevista para girar entre 76 milhões e 78 milhões em 2021.

“Ainda não sabemos a medida exata de como essa situação afeta as fabricantes no Brasil, as equipes de logística e produção estão se desdobrando, todo dia tem um problema, muitos insumos ainda estão em falta, como aço, pneus, borracha e plásticos. Estamos nos reunindo com as associações de cada setor industrial para tentar mitigar os efeitos sobre a produção, mas o problema dos semicondurores é mais complexo, porque é global e deve se arrastar até o fim do ano”, afirma Moraes.

Ao mesmo tempo em que faltam componentes, tudo está mais caro, o que já provocou reajustes médios de 16% nos preços dos carros em 2020 e de mais algo como 5% no primeiro semestre deste ano. Ainda assim, Moraes alerta que os fabricantes ainda estão longe de compensar toda pressão de custos que vêm sofrendo. Ele elencou que nos últimos 12 meses alguns dos principais insumos e serviços utilizados pela indústria registraram aumentos expressivos, como aço (61%), resinas plásticas e elastômeros/borrachas (68%), pneus (16%), alumínio (13%), frete aéreo (105%), frete marítimo (339%), aluguel de contêiner (170%), com efeitos aprofundados pela desvalorização cambial de 39% no período, com a cotação do dólar passando de R$ 5,60.

O presidente da Anfavea destacou ainda que a crise conjuntural e de saúde provocada pela pandemia acabou também por realçar as deficiências estruturais do País, que persistem há décadas mas voltam à tona em momentos de estresse econômico, como carga tributária elevada, infraestrutura ineficiente e inseguranças jurídicas.

Apesar de todos os ventos contrários, Moraes disse que a Anfavea vai manter as projeções de crescimento para este ano, de 15% de expansão do mercado doméstico (2,37 milhões de veículos), produção 25% maior (2,52 milhões) e incremento de 9% nas exportações (353 mil unidades). Isso porque, segundo ele, a entidade já tinha ajustado para baixo suas previsões na passagem do ano, divulgando em janeiro números mais conservadores do que os imaginados em dezembro.

“A neblina continua e ainda há muitas incertezas à frente, com possibilidade de recessão econômica no primeiro semestre com a intensificação da pandemia, inflação e juros com tendência de alta, desemprego forte, muita volatilidade cambial. Tudo isso limita nossas expectativas de crescimento, mas vamos aguardar mais clareza para refazer projeções”, ponderou Moraes.

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